Oyuna Uranchimeg: a jogadora de curling em cadeira de rodas americana que encontrou um novo caminho após um acidente que mudou sua vida

Da Mongólia para os EUA, de pensamentos suicidas para candidata a medalha Paralímpica, Batoyun 'Oyuna' Uranchimeg conta sua história: "É apenas surreal".

6 minPor Ken Browne
Oyuna Uranchimeg at the Beijing 2022 Paralympic Winter Games. Image: Olympics.com

"Digo às pessoas que esse é o país onde eu renasci", disse Oyuna Uranchimeg, jogadora de curling em cadeira de rodas dos EUA.

"Porque foi o acidente que me levou aos EUA com essa nova vida, esse novo caminho. É incrível e muito satisfatório poder representar o país neste nível".

Uranchimeg falou ao Olympics.com durante os Jogos Paralímpicos de Inverno Beijing 2022.

Há 20 anos, ela visitou os EUA, vinda da Mongólia, e sua vida mudou para sempre.

"Depois de uma semana da minha chegada aos EUA, tive um acidente de carro e tive uma lesão da medula espinhal que me paralisou da cintura para baixo. Tive que usar uma cadeira de rodas para o resto da vida".

"Quando esse tipo de coisa acontece, você fica deprimida, você perde a esperança para sua vida e seu futuro. E quando você não vê esperança para o seu futuro, é difícil viver.

"Então eu estava em um ponto logo após minha lesão em que houve momentos que contemplei suicídio e coisas assim, porque achava que minha vida havia acabado".

Oyuna Uranchimeg: "Tive que seguir em frente por meu filho"

"Acho que isso faz parte do processo de luto", ela continua.

"Quando você perde algo grande na sua vida, porque perder metade da função do seu corpo é algo grande, você não move as pernas, não pode senti-las...

"Não só isso, mas você não pode ir ao banheiro como ia antes. É uma mudança muito grande na sua vida.

"Então quando eu passava pelos estágios do luto, eu me senti assim. Mas muitas pessoas me ajudaram a sair daquela situação, a ver as coisas de uma maneira diferente, me dando esperança.

"Tive que seguir em frente e não tinha escolha, especialmente quando você tem filhos, se você é mãe ou pai, tem a obrigação de criar seus filhos e estar lá para eles, não é?

"Eu tinha um filho, então não poderia dizer 'Ok, é isso, eu vou morrer e não interessa o que vai acontecer com meu filho'. Eu não posso fazer isso.

"Não tive opção ou escolha além de ser mãe e continuar criando-o, então acho que isso me ajudou a superar... a ignorar minha mágoa e seguir em frente."

"Quando coisas trágicas acontecem, a maioria das pessoas pensa 'como essa pessoa pode superar isso? Se eu estivesse no lugar dela, não conseguiria sobreviver ou lidar com isso.'

"Mas quando você está passando por aquilo, não tem escolha além de superar, não há alternativa... Acho que a única outra escolha seria só desistir e morrer".

"Especialmente quando seus filhos são pequenos e precisam muito de você. Foi muito difícil estar longe deles quando eles precisam de você. Acho que meu filho sofreu muito também.

"Costumo chorar toda vez que falo desses assuntos", ela disse quando as lágrimas começaram a cair, "porque meu pobre menino, com apenas seis anos, nunca havia ficado longe da mãe e do pai.

"Ele sentia minha falta todos os dias, então foi muito difícil".

"Meus filhos têm muito orgulho de mim"

Agora, seus filhos estão assistindo com orgulho a sua mãe competindo nos Jogos Paralímpicos de Inverno Beijing 2022 representando os EUA, apesar de ela ter começado no curling há apenas seis anos.

"Meu filho estava ontem vendo o jogo EUA x Noruega com seus colegas de trabalho e eles estavam gritando com a tela porque foi um jogo muito intenso.

"Ambos estão extremamente orgulhosos de mim. Uma coisa como mãe que eu gostaria de dar exemplo aos meus filhos é o que significa ter um objetivo e o que é necessário para atingi-lo.

"Espero que meus filhos vejam que estou indo atrás desse objetivo, que tentarei alcançá-lo, e que eles internalizem isso. Dessa forma, em qualquer objetivo que eles tenham eles farão o mesmo, não vão desistir e vão alcançá-lo.

"Na verdade, minha filha está se preparando para o exame para a faculdade de medicina, então espero que ela atinja essa meta e espero inspirá-la para que ela não desista".

Como um brunch levou Oyuna Uranchimeg aos Jogos Paralímpicos

Como o curling em cadeira de rodas entrou na vida dela?

"Até seis anos atrás, não sabia nada sobre curling, então a única vez que eu vi curling foi na TV durante os Jogos Olímpicos.

"Você troca de canal e tem pessoas deslizando uma pedra, parece que tem alguém limpando a pedra e não fazia ideia do que era.

"Na verdade, tinha um amigo que era curler, então ele comentou, mas não prestei atenção. Mas esse amigo um dia me ligou e disse que tinha uma surpresa para mim, que queria que eu conhecesse algumas pessoas.

"Então apareci porque ele disse que tinha um brunch, e falei 'ok, vou comer!'

"A surpresa foi que ele me apresentou ao time nacional e aos treinadores quando eles treinavam em Blaine, Minnesota, há seis anos.

"Nunca havia pensado em ser atleta até aquele ponto. Tinha uma vida normal, trabalhando em tempo integral e me preocupando com as contas, cuidando dos meus filhos... um vida bem típica.

"Foi uma surpresa muito boa, eu acho, algo que mudou minha vida daquele momento em diante".

"Ainda parece surreal para mim"

Alguns anos depois, Oyuna estava em um avião para os Jogos Paralímpicos.

"É meio surreal, eu realmente estou aqui rodeada por esses grandes atletas, não só da minha equipe.

"Todos os outros atletas, que estiveram várias vezes nos Jogos, pessoas que alcançaram tanto em suas carreiras, muitas medalhas de ouro e prata.

"O time de hóquei, de cross-country, esqui alpino... é inacreditável. Eu realmente estou no meio dessas pessoas. É apenas surreal.

"Eu era uma assistente administrativa num escritório ajudando as pessoas, então nunca me imaginei sendo chamada de atleta e representando o país.

"Ainda parece surreal para mim, é louco. Não sei o que fiz em minha vida passada para merecer isso, devo ter salvado o país para ser recompensada para essa oportunidade! É incrível".

Oyuna Uranchimeg: "Orgulho do que conquistei"

"Não sou super competitiva, mas gosto de ser a melhor", ela continua.

"Mas acho que sou um pouco perfeccionista e quando estou fazendo algo, quero que seja perfeito, então por isso que o curling combina com a minha peronalidade.

"Quando você está treinando, você quer aquela jogada perfeita, certo? Acho que [no curling], você meio que compete contra si mesmo. No meu caso, eu jogo contra mim mesma e estou tentando superar a versão de ontem de mim.

Uranchimeg quer escrever uma nova página na história Paralímpica, ganhando a primeira medalha de curling dos EUA nos Jogos Paralímpicos de Inverno. Mas mesmo se ela não conseguir esse feito, ela sabe que foi muito longe.

"Mesmo se voltarmos sem a medalha, ainda ficaria muito orgulhosa do que conquistamos até hoje e com a experiência que tive aqui".

Ela já está de olho nos Jogos Paralímpicos de Inverno Milano Cortina 2026, que terá a estreia das duplas mistas no curling em cadeira de rodas.

Oyuna Uranchimeg está apenas começando.

Se você tem pensamentos suicidas e está no Brasil, procure ajuda ligando para 188 (Centro de Valorização da Vida) ou 192 (SAMU). Você também pode procurar ajuda nos CAPS, Unidades Básicas de Saúde ou hospitais.

Se estiver em Portugal, contate o Serviço de Saúde Mental do Hospital da sua região – AdultosInfância e Adolescência. A linha SNS24 (808 242424 e www.sns24.gov.pt) e o 112 também estão disponíveis. Entre em contato através das Linhas de Crise e da Linha de Aconselhamento Psicológico.

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