Nova cara do judô brasileiro, Guilherme Schimidt embarca para o Mundial: 'Quero deixar o meu legado'

Aos 21 anos, judoca brasiliense faturou duas etapas de Grand Slam em 2022 e falou com o Olympics.com antes de partir para o seu principal compromisso na temporada: o Campeonato Mundial, no Uzbequistão.

9 minPor Virgílio Franceschi Neto
Guilherme Schimidt durante o Mundial Júnior de judô de 2019, no Marrocos.
(Emanuele di Feliciantonio)

Em janeiro de 2022, começava mais uma temporada de judô para a maioria dos atletas no hemisfério sul do globo, entre eles, Guilherme Schimidt.

Judoca meio-médio (até 81kg), retomava os trabalhos para a temporada em Belo Horizonte, com o Minas Tênis Clube, instituição que representa.

"Comecei o ano confiante", recorda Schimidt. "Em janeiro eu vinha em um momento de ascensão, da vitória no GP de Zagreb, campeão Mundial militar, campeão pan-americano", completou.

Mal esperava o que o ano poderia reservar. O brasiliense faturou duas etapas de Grand Slam, o circuito mundial de judô. Em abril, vitória em Antalya, na Turquia. Em julho, ouro em Budapeste, na Hungria.

Antes não muito bem ranqueado, os recentes resultados colocaram-no em quarto do mundo na categoria. Estudioso, passou a ser estudado e bastante requisitado para treinamentos.

"No alto rendimento são detalhes que fazem a diferença. Você está sendo estudado constantemente. Todos te estudam porque querem ganhar de você", falou.

De malas prontas para Tashkent, no Uzbequistão, embarca para a disputa do Mundial de Judô, de 6 a 13 de outubro.

Um título que ele não quer deixar escapar. Com um espírito competitivo evidente na fala e nos gestos, Schimidt conversou com o Olympics.com.

(Tamara Kulumbegashvili)

Um judoca estudioso

Esteve presente em Tóquio 2020 através de um projeto de vivência Olímpica. Oportunidade não apenas para fotos e experiência para a vida. Para Guilherme Schimidt, foi um período de bastante estudo.

Levou cadernos e blocos de anotação para estudar todos os seus adversários de categoria. Sem exceção.

"Como o adversário luta, como ele segura no quimono, os golpes que fazem", disse. A partir de então ele já visualiza uma espécie de "mapa" da luta. "Nisso eu monto estratégias em que eu consigo melhor usar os meus golpes, o que eu não posso errar e o que eu posso ser capaz de fazer. Eu estudo muito o judô", acrescentou.

Entre os estudados, o medalhista de bronze do meio-médio, Matthias Casse (BEL), e uma das suas referências, Saeid Mollaei, do Azerbaijão, prata nos Jogos da capital japonesa. Recordou: "Me mantinha pronto para as oportunidades que fossem surgir neste ciclo para Paris."

Um início de 2022 não tão bom

Apesar de estar confiante e vindo de 2021 com bons resultados internacionais, Schimidt sentiu-se fora de ritmo, depois disputar torneios na Europa no começo do ano, ainda resquício das restrições impostas por conta da pandemia da Covid-19.

A vinda de dois treinos internacionais em território brasileiro, meses depois, permitiram ao judoca ambientar-se ao cenário de competições. Na verdade, mostraram-se fundamentais.

"Esses treinamentos me ajudaram muito porque o ritmo do judô europeu e asiático é diferente. É preciso fazer isso para sentir o estilo da luta", explicou. "Foram dois treinamentos internacionais e, logo após, fiquei campeão em grands slams."

A primeira vitória em Grand Slam: Turquia

Logo após o primeiro treino internacional organizado no Brasil neste ano, Schimidt foi para a disputa do Grand Slam de Antalya, na Turquia.

Na bagagem, todas as anotações feitas em Tóquio. Na cabeça, toda a estratégia para a competição.

"Fui com a estratégia montada desde o Brasil. Sabia que ia enfrentar o belga (Matthias Casse) nas quartas (de final). Deu certo, era o que eu esperava e já tinha estudado", lembrou-se.

Foi campeão.

Relembre | O ouro de Guilherme Schimidt na Turquia

A segunda vitória em Grand Slam: Hungria

Regressou ao Brasil e, na agenda, mais um treinamento internacional, em junho. Na sequência, a etapa de Budapeste, na Hungria, do Grand Slam de 2022.

Em território magiar, o seu segundo ouro, ainda mais especial para o brasiliense: "Na Turquia eu estava em uma forma, na Hungria foi uma grande conquista porque foi contra alguém que sempre admirei. Foi como enfrentar um ídolo e superá-lo. Foi muito marcante para mim vencer o Said Mollaei."

Uma importante vitória, mas não se esquece de mencionar o bronze no Mundial Júnior do Marrocos, em 2019, uma das mais especiais da carreira.

Schimidt já não é mais surpresa

O próprio Guilherme admite que por não estar bem ranqueado antes desses dois eventos que venceu, acabou tornando-se um fator surpresa para a categoria.

Mas, já não mais é assim. Antes, ia atrás de todos para treinar. Hoje, todos o procuram. Sobre isso, refletiu: "Agora em Riccione (Itália), durante mais um treino internacional, eu fui muito procurado. Antes eles treinavam mais soltos, hoje quando treinam comigo, escondem muito de mim."

Pronto para o Mundial

Outubro de 2022.

Schimidt vai agora para o Mundial sênior, colocar à prova o trabalho de toda uma temporada.

O comportamento defensivo dos adversários e a competitividade dos oponentes não o assustam. Sequer uma eventual pressão por conta dos resultados recentes. Pelo contrário, é algo que o motiva: "Uma motivação, sinal de que o trabalho está sendo feito certo, na direção correta. Isso me motiva ainda mais."

Sobre os rivais mais perigosos, demonstra segurança e, ao mesmo tempo, cautela: "Não segurei apenas no quimono do (atual campeão Olímpico) Nagase (JPN) e do LEE Joon-hwan (KOR), que apareceu em dois Grand Slams (Tbilisi, na Geórgia e Ulan Bator, na Mongólia), venceu ambos e sumiu, justamente para que os adversários não o conheçam. Alguém misterioso, perigoso, mas com um estilo parecido com o meu. Esses dois eu considero os mais fortes por eu não ter treinado e competido. Não sei o que vem."

Para Schimidt, o Mundial é muito mais complexo do que qualquer Grand Slam: "O nível é parecido, mas no Grand Slam sempre faltam excelentes atletas. Por exemplo, dos top 10 do mundo, vão seis. No Mundial, dos 30 primeiros, vão os 30."

Por isso é preciso estar preparado o tempo todo, antes mesmo da primeira luta.

Há entretanto um outro aspecto que ele menciona ser bastante importante: "Venho treinando muito a parte mental. É um trabalho diário que você aplica nos treinos. Você tem que chegar na competição sentindo que você já fez tudo o que podia e que só vai para executar. É preciso focar em uma coisa de cada vez. Primeiro no peso, depois o primeiro chaveamento. Não dá para olhar lá na frente. É preciso ir batalha por batalha."

De maneira gradual. Fator que é sua base de sustentação para o Mundial: "Estou pronto, vou para o título, um passo de cada vez, mas vou para ser campeão." E complementa: "Posso falar de mim. Venho de uma preparação muito boa. Treinei muito bem recentemente na Itália, peguei os principais atletas da minha categoria."

Uma escalada que já tinha em mente

Visualizar os sonhos, projetar cenários e situações, não é algo novo para Guilherme.

Começou no judô aos oito anos, em 2009, a fim de que soubesse controlar a agitação típica da infância. Foi paixão à primeira vista. Quando estreou em um campeonato brasileiro, perdeu a luta inicial. Da derrota, a lição: "Me dei conta de que se quisesse vencer, teria que levar mais a sério e treinar mais."

Em 2014 conquistou a sua primeira medalha no Brasileiro, a de prata, o que deu a ele um lugar no Campeonato Sul-americano de base. Novamente prata, viu a bandeira brasileira sendo hasteada e o hino tocado para os colegas de equipe que venceram.

"Ali eu percebi que era isso que queria. Fazer história, integrar a seleção e ir para os Jogos Olímpicos", recorda-se.

De olho em Paris 2024

Estar nos Jogos é objetivo e, uma medalha Olímpica, sonho de vida. Não pensa nisso agora, mas também não tira da mente.

É ponderado e sabe o que lhe espera. Tem a resposta e se manifesta: "(Paris 2024) é um ciclo mais curto, mas caminhada mais longa. Em 2023 vai ser uma competição atrás da outra. Sou abençoado por não ter lesões, algo que me atrapalhe. É o que mais pode incomodar um atleta: lesão. Estou bem confiante, gosto de competir e já mostrei que sou um dos melhores. Quero agora até os Jogos, ser o melhor."

Para quem quer ser o melhor, ele possui alguns exemplos. Orgulhoso da sua origem na Capital Federal, isso fica mais evidente quando menciona os conterrâneos Ketleyn Quadros e Luciano Corrêa, campeão mundial em 2007 e responsável por levá-lo ao Minas Tênis Clube.

"É um orgulho ter uma conterrânea medalhista Olímpica, Ketleyn Quadros, e um grande orgulho haver treinado no mesmo tatame que ela. Luciano Corrêa foi meu treinador, quem me viu e me trouxe para o Minas (Tênis Clube). É campeão e me espelho nele."

(Gabriela Sabau)

Raízes fortes e grandes sonhos

Ao fim da entrevista, Schimidt falou bastante sobre o que quer para a carreira e para o judô do Brasil. Falou sobre as ajudas que teve e das dificuldades que superou, sobretudo as financeiras. Sonha em ser campeão Mundial e Olímpico, mas não só isso: "(Quero) que o judô do Brasil faça história. Que a equipe do Brasil faça história em Paris 2024, com todos os atletas medalhando e que o pódio venha no torneio por equipes mistas."

Afinal, deseja muito mais: "Quero deixar o meu legado para o judô nacional e mundial."

A certeza do que quer é algo comum para quem sabe de onde veio e onde quer chegar. Schimidt é assim. "Eu amo o que eu faço. Eu amo treinar e evoluir. Amo competir e chegar a uma melhor versão de mim", comentou.

Durante a conversa ele diversas vezes citou Brasília e suas origens. Taguatinga, onde cresceu, e Ceilândia, onde começou no judô. "Tenho muito orgulho de ser de Brasília. Um celeiro de atletas, em todos os esportes sempre tem alguém do DF (Distrito Federal) em destaque. Podemos não ter clubes, mas o candango (o natural de Brasília) tem muita vontade de vencer e eu levo isso comigo."

Fez lembrar um dos versos da canção 'Surfista do lago Paranoá', da banda brasiliense Natiruts: "Prometo que eu vou me esforçar para um dia no topo eu chegar."

Um topo que é questão de tempo e trabalho. "Eu tinha colocado o objetivo para o ano de uma medalha em Grand Slam e acabei levando duas. De ouro", encerrou.

A seleção brasileira no Mundial Sênior, em Tashkent (UZB)

Equipe masculina

  • Até 60kg - Allan Kuwabara
  • Até 66kg - Willian Lima; Eric Takabatake
  • Até 73kg - Daniel Cargnin
  • Até 81kg - Guilherme Schimidt
  • Até 90kg - Rafael Macedo; Marcelo Gomes
  • Até 100kg - Rafael Buzacarini
  • Acima de 100kg - Rafael Silva; Juscelino Nascimento (apenas por equipes)

Equipe feminina

  • Até 48kg - Amanda Lima
  • Até 52kg - Larissa Pimenta
  • Até 57kg - Rafaela Silva; Jéssica Lima
  • Até 63kg - Ketleyn Quadros
  • Até 70kg - Luana Carvalho; Maria Portela
  • Até 78kg - Mayra Aguiar
  • Acima de 78kg - Beatriz Souza

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Como assistir ao Mundial de Judô

O Campeonato Mundial Sênior de Judô acontece de 6 a 13 de outubro, em Tashkent (Uzbequistão), e terá a transmissão do Canal Olímpico do Brasil e também dos canais Sportv.

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