Exclusiva com Italo Ferreira: ‘Tive que batalhar para me verem como alguém diferenciado’

Às vésperas do início da temporada do surfe, o astro brasileiro relembra sua jornada das águas de Baía Formosa ao ouro olímpico, comenta o legado que tem construído em sua cidade e exalta rivalidade sadia com Filipe Toledo e Gabriel Medina.

6 minPor Sheila Vieira
Italo Ferreira campeão Olímpico na praia Tsurigasaki
(Ryan Pierse/Getty Images)

No momento em que Italo Ferreira subiu ao pódio como primeiro campeão olímpico da história do surfe masculino, em Tóquio 2020, não era apenas a bandeira do Brasil que ele representava.

Também era o triunfo de um atleta que precisou se provar desde o início de sua jornada, na prancha de isopor em uma vila de pescadores, até o seu primeiro título.

“Tive que batalhar para me verem como alguém diferenciado”, contou Italo com exclusividade ao Olympics.com antes de partir para o Havaí, onde a temporada da Liga Mundial de Surfe (WSL) começa neste domingo (29).

O surfista de 28 anos não só chegou ao topo, como fez história para o seu esporte.

“Outros caras vão vencer [os Jogos Olímpicos], mas o primeiro ninguém nunca vai esquecer. Meu nome estará lá.”

Veja a seguir o que Italo tem a dizer sobre sua inspiração em Rayssa Leal em Tóquio, sua rivalidade com Filipe Toledo e Gabriel Medina e como o surfe inspira todas as gerações.

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(2022 World Surf League)

Italo Ferreira e o ouro olímpico: inspiração em Rayssa Leal

Quando o surfe foi confirmado nos Jogos Olímpicos Tóquio 2020, Italo sabia o quanto o evento poderia mudar sua vida.

“Aquilo fixou na minha mente, foi uma obsessão para eu marcar meu nome no cenário mundial. Acho que Deus escreveu a melhor história”, ele disse.

Mesmo assim, ele ainda se impressionou com a magnitude dos Jogos.

“Não tinha noção do quão grande era a Olimpíada. Sabia que era grande, mas quando comecei a competir e entrei nas redes sociais, eu realmente vi o impacto que causava.”

Ao ver a skatista brasileira Rayssa Leal conquistar a medalha de prata, Italo se sentiu ainda mais inspirado.

“Foi algo tão importante para o esporte dela, o skate. Uma menina tão nova levar uma medalha para casa. Dois dias depois, eu estava na mesma situação. Tinha a oportunidade de ganhar o primeiro ouro do Brasil.”

“Foi algo muito grande para o esporte ser o primeiro campeão olímpico do surfe. Outros caras vão vencer, mas o primeiro ninguém nunca vai esquecer. Meu nome estará lá”, acrescentou Italo.

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O surfe em Paris 2024 será nas temidas ondas de Teahupo’o, no Taiti. Italo nunca venceu por lá, mas tem confiança que pode repetir o ouro.

“Sei que na hora certa Deus vai preparar algo para mim. Tenho me dedicado bastante nos últimos anos a esse tipo de onda tubular”, comentou.

“É um dos meus sonhos também ser campeão olímpico novamente.”

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Italo Ferreira e o legado para Baía Formosa

Por mais que Italo Ferreira goste muito de vencer, sua paixão pelo surfe vai além de troféus e medalhas.

“Quando você está na água, é um momento que esquece tudo. Me faz bem e faço desde criança. É uma conexão com Deus também”, contou.

Ao voltar para Baía Formosa, Italo reencontra o menino que pulava ondas com uma "prancha" improvisada de isopor que seu pai usava para vender peixes.

“Hoje em dia estou bem mais conhecido por causa das Olimpíadas, mas levo numa boa também. Sou igual a qualquer pessoa, só tenho títulos, mas isso não me faz melhor do que ninguém”.

Italo inclusive lembra que a facilidade com as manobras aéreas, sua marca registrada, vem justamente da infância.

“Quando eu era pequeno, eu pulava tudo. As ondas daqui não dão muito espaço, então minha primeira manobra da vida foi um aéreo. Quase tive que voltar atrás para aprender as outras”.

Em casa, Italo também entende o tamanho de seu legado. Ele inaugurou um instituto em sua cidade natal para incentivar jovens a surfar, como Arthur Vilar, de 11 anos, que virou o pupilo do campeão olímpico.

“O instituto vai somar para a comunidade local, para que as crianças tenham oportunidades, uma luz e direção”, afirmou.

E não são só as crianças que se inspiram em Italo.

“Conheci uma senhora de uns 68 anos. Ela disse que começou a surfar porque me viu nas Olimpíadas e que o surfe foi uma das melhores coisas que ela fez na vida”.

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Italo Ferreira sobre a Brazilian Storm: ‘A gente puxa o nível do outro’

Desde 2014, apenas o havaiano John John Florence impediu que a “Brazilian Storm” vencesse a Liga Mundial de Surfe (WSL). Gabriel Medina foi campeão três vezes (2014, 2018 e 2021), Adriano de Souza, já aposentado, triunfou em 2015, Italo venceu em 2019 e Filipe Toledo levantou o troféu em 2022.

“A gente puxa o nível do outro. Quando um ganha, o outro sempre está ali perto. Temos muitas histórias para contar, e as baterias que nos enfrentamos são as melhores baterias. Quando eu comecei, todo mundo falava que queria competir com o Kelly [Slater] ou o John [John Florence]. Hoje essas pessoas são do Brasil”, ele diz com orgulho.

Mesmo com uma fissura no osso no pé, Italo conseguiu disputar a final em 2022 e ficar com o vice-campeonato, perdendo para Filipinho.

“Carreguei essa lesão na final, mas não podia abrir mão da oportunidade. Depois fiquei nos EUA para ficar parado, porque eu sabia que se voltasse para casa, a chance de eu voltar para a água era 110%”, confessou.

A Championship Tour da WSL e 2023 começa neste domingo, 29 de janeiro, no Havaí, valendo vaga para Paris 2024.

“2022 foi um dos anos mais constantes da minha carreira. Não venci nenhuma etapa, mas me classifiquei para a final e fui vice, que é positivo. O foco é me manter no topo”.

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Italo Ferreira: 'Sei o meu propósito'

Para encontrar a motivação de buscar mais, Italo relembra seu início no esporte, quando poucos acreditavam no seu potencial.

“Em 2019, quando fui campeão, ninguém falava de mim. Assisti a um vídeo com uma crítica e me tocou muito. Me superei e conquistei o título”, contou.

“No juvenil, quando fazia parte de uma boa equipe, era sempre o último da lista. Ninguém pensava no Italo. Achava que as pessoas tinham que ver meu valor e que eu podia ser tão bom ou até melhor que os outros caras”, disse. “Tive que lutar para me verem como alguém diferenciado”.

Como não sucumbir e se fortalecer diante da desconfiança externa? Eis o recado de Italo:

“Você tem que estar presente diariamente, pensar no que você acredita. Muita gente tenta te diminuir através de um telefone [redes sociais], algo descartável. Você precisa lembrar ‘por que estou fazendo isso?’, ‘por que estou indo treinar?’. Sei o meu propósito e que se eu me dedicar e acreditar até o fim, consigo alcançar qualquer coisa”.

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