Após ‘fila da sopa’ e resultados históricos, Edson Bindilatti encara última missão no bobsled: treinar seu substituto
Piloto brasileiro deixou aposentadoria de lado para buscar sua sexta participação nos Jogos Olímpicos de Inverno em Milano Cortina 2026 e preparar novos pilotos para substitui-lo no trenó da equipe brasileira.
Um dos principais mantras corporativos afirma que o bom líder deve sempre preparar alguém para substitui-lo no futuro. Edson Bindilatti não usa terno e nem trabalha em escritório, mas está vivendo isso agora com o bobsled do Brasil. Prestes a estrear na temporada pré-Olímpica, ele retornou às pistas para treinar seus substitutos.
Aos 45 anos, deixou a aposentadoria de lado e vai comandar novamente o trenó brasileiro na disputa da Copa América nesta temporada. As primeiras etapas serão em Whistler, no Canadá, neste fim de semana. No 2-men serão duas etapas nos dias 22 e 23 de novembro; com o 4-men, mais duas provas nos dias 25 e 26.
Após conquistar o inédito top 20 nos Jogos Olímpicos de Inverno Beijing 2022, o veterano atleta estava disposto a sair de cena e abrir espaço para jovens pilotos, como Gustavo Ferreira, presente nos Jogos Olímpicos de Inverno da Juventude Lausanne 2020.
Contudo, a mudança no sistema de classificação da modalidade para Milano Cortina 2026 (que utilizará o ranking combinado em vez das classificações individuais), aliada à inexperiência dos jovens pilotos na pilotagem de um trenó para quatro pessoas, fez a equipe solicitar o retorno de Edson Bindilatti.
Ele topou a empreitada de buscar sua sexta participação Olímpica de inverno, mas com duas condições. A primeira é de alcançar um novo resultado histórico na pista italiana, superando a campanha de 2022. A segunda é que ele quer treinar estes jovens justamente para que possam assumir a titularidade de vez após 2026.
“Esse é o meu maior objetivo e a minha inspiração”, admitiu em entrevista exclusiva ao Olympics.com.
Tanto que Gustavo Ferreira estará também na disputa da Copa América, participando de provas para ganhar experiência na pilotagem e se credenciar à participação Olímpica. Já André Luiz Silva, presente nos Jogos Olímpicos de Inverno da Juventude Gangwon 2024, ficará como reserva da equipe brasileira.
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Edson Bindilatti passou pela ‘fila da sopa’ nos EUA e se tornou referência no bobsled
Poucos profissionais possuem tamanha experiência para treinar seus substitutos quanto Edson Bindilatti. Em 2025 ele completará 25 anos de carreira no bobsled e pode falar que viveu (quase) tudo na modalidade. “Dá um livro grande, de 500 páginas para mais, se fosse contar todas as histórias”, diverte-se.
Histórias que incluem as viagens de 465km entre Nova York e Lake Placid, nos EUA, em uma van com mais quatro pessoas e um trenó de 210 quilos e com mais de três metros de comprimento. Ou ainda as ‘filas de sopa’ nas igrejas norte-americanas porque não havia muito dinheiro para alimentação e era necessário economizar.
Mas com sua atuação dentro – e fora – das pistas de gelo, mudou o cenário do esporte no Brasil ao longo do tempo. Antes de Sochi 2014 ele retomou o desenvolvimento do bobsled no país, ajudou a montar uma nova equipe que, pouco a pouco, cresceu.
Foi campeão geral da Copa América em 2015 e 2018 (conquistas impensáveis há alguns anos), chegou a ficar em 17º no ranking internacional em 2017 e obteve o tão sonhado top 20 Olímpico em Beijing 2022.
“Foi uma carreira, ao meu ver, muito bonita, de muita dedicação, muito empenho e muita resiliência. A gente passou por muitas coisas no bobsled e fiz parte de uma reconstrução, ou melhor, de uma construção”, prosseguiu.
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Edson Bindilatti ajudou a montar seleção permanente de bobsled no Brasil
Quando entrou no bobsled, Edson Bindilatti era o breakman, ou seja, a pessoa responsável por frear o trenó após cruzar a linha de chegada. Foram quase dez anos também atuando como pusher**,** o atleta que faz a força no trenó na largada. Depois ele se dedicou exclusivamente à pilotagem, se aperfeiçoando com o tempo.
Experiência que ele soube colocar em prática na hora de montar a equipe a partir de 2013. Edson Martins, Erick Vianna e Rafael Souza integram a seleção brasileira há mais de uma década. Jefferson Sabino, que competiu no salto triplo em Beijing 2008, entrou em 2021. A equipe também era formada por Odirlei Pessoni, “o nosso coração”, como resume Bindilatti, mas que faleceu em acidente de moto em março de 2021.
“Foi um trabalho de formiguinha. A gente hoje tem uma sincronia muito grande”, afirma. “Hoje eu chego na pista e não preciso nem olhar o trenó, os atletas já estão trabalhando nele. Tenho uma confiança tão grande neles que só chego, coloco o capacete e vamos embora”, complementa.
Mesmo assim, a equipe faz seletivas sempre que possível para buscar novos talentos e fortalecer o grupo. Os interessados precisam atingir requisitos mínimos nos testes (inclusive os atletas atuais) para manter a excelência física. Foram duas em 2024 e a expectativa é de mais uma em 2025 - além de buscar atletas mulheres para o monobob e o 2-women, principalmente após Milano Cortina 2026.
Sob comando de Jo Manning, Edson Bindilatti sonha com top 10 em despedida
Diante disso, o que Edson Bindilatti ainda almeja no bobsled? “Se a gente tiver material específico para a competição, pode brigar para estar entre os dez melhores do mundo”, explicou, projetando a disputa em Milano Cortina 2026.
Seria um objetivo ousado demais para uma equipe que em 2022 comemorou a 20ª posição na capital chinesa? “Não gosto de ficar falando dessa forma porque parece que é uma coisa acima do que realmente é, mas a gente sabe do nosso potencial e do quanto a gente é bom”, sentenciou.
O segredo para isso é encontrar bons equipamentos – o que no caso significa ter um trenó de ponta. Um novo em folha feito especialmente para competição gira em torno de 130 mil euros, um valor ainda inviável para a realidade brasileira. Mas é possível alugar e encontrar boas pechinchas.
Justamente por isso o Brasil retomou a parceria com a técnica britânica Jo Manning, responsável pelo período mais bem-sucedido da equipe entre 2016 e 2018. Mais do que orientar nas pistas de gelo, ela tem a capacidade de abrir portas para a equipe em qualquer pista do mundo.
"Ela consegue muita coisa que a gente tem mais dificuldade para conseguir. Essa agilidade que a Jo tem vai ser importantíssima. Deixa a gente focado na preparação e no que sabe fazer de melhor, que é empurrar o trenó, pilotá-lo e fazer o resultado”, concluiu.