Mafê Costa evolui rapidamente e se revoluciona como destaque da natação na Seletiva Olímpica
A natação é um esporte disputado nas casas decimais do cronômetro - por vezes, até nas centesimais. Segundos podem significar uma eternidade dentro da piscina. Ou então, uma ascensão meteórica. São os segundos que explicitam a impressionante evolução de Maria Fernanda Costa, aos 21 anos, entre as melhores nadadoras do mundo.
Até o final de 2022, Mafê Costa nunca tinha nadado os 400m livre abaixo dos 4:17. A carioca teve o oitavo tempo do Brasil naquele ano, mais de oito segundos abaixo da melhor marca do país. Desde então, Mafê transformou suas perspectivas. Atingiu a casa dos 4:06 em 2023 e, no Mundial de Esportes Aquáticos 2024, nadou os 400m livre a 4:02.86. Baixou seu tempo em quase 15 segundos, a cinco décimos de subir ao pódio no Mundial.
O desenvolvimento de Mafê não se restringe a uma prova. Ela também melhorou de forma expressiva nos 200m livre: chegou a 1:56.85, quase cinco segundos abaixo de sua melhor marca em 2022. O tempo rendeu a quinta colocação no Mundial 2024. Assim como nos 400m, Mafê virou a nova recordista sul-americana na distância.
O Mundial de Esportes Aquáticos 2024 alçou Mafê entre os protagonistas da natação brasileira às vésperas dos Jogos Olímpicos. A carioca oferece tempos que podem render finais em Paris 2024. E pela maneira como a nadadora se supera nos últimos meses, não tem como duvidar de novos recordes pessoais. Quem referenda essa visão é Fernando Possenti, seu treinador desde o início de 2023 e com responsabilidade direta neste salto.
"No ano passado, se você olhar todas as provas que ela nadou, ela caía na água e melhorava, caía na água e melhorava. E ainda tem espaço, isso é que é o melhor, tem espaço de melhora", declarou Possenti, em fevereiro de 2024, ao ge.globo.
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Mafê Costa será uma das estrelas da Seletiva Olímpica Brasileira de Natação, que acontece nesta semana, no Rio de Janeiro. A carioca já tem índice Olímpico nos 200m e 400m livre, mas a competição é obrigatória para os atletas que almejam confirmar presença em Paris 2024. Mafê também está inscrita nos 100m e nos 800m livre, bem como nos 200m borboleta. Será uma ocasião para consolidar seu nome dentro do cenário nacional e partir com mais força rumo à sua estreia nos Jogos Olímpicos.
"Com os treinos do Fernando, com a análise que a gente tem, com o trabalho que a gente faz no COB, dá pra evoluir mais, dá pra brigar por uma medalha, dá pra sonhar com uma final olímpica sim. Eu acho que tudo é possível, eu acho que a gente vai evoluir bastante ainda", afirmou Mafê Costa, em entrevista ao COBcast, em março.
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A virada de chave para Mafê, a partir do encontro com Possenti
Maria Fernanda Costa era uma atleta reconhecida até 2022, mas não figurava na primeira prateleira de nadadoras do Brasil. Seus resultados no Troféu Brasil 2022 enfatizam essa noção: Mafê conquistou uma prata na competição, nos 200m borboleta, mas sequer chegou ao pódio nas provas em que se tornaria recordista sul-americana dois anos depois. Foi a sétima nos 400m livre e a nona nos 200m livre, sem sequer disputar esta final.
A virada de Mafê aconteceu a partir de janeiro de 2023, quando passou a ser orientada por Fernando Possenti. O treinador é reconhecido como um dos melhores do mundo, sobretudo pelo trabalho que desenvolveu em águas abertas com Ana Marcela Cunha. A própria Mafê o procurou, diante do incentivo de outras nadadoras. Disse que queria ir aos Jogos Pan-Americanos e aos Jogos Olímpicos.
"Quando eu fui trocar ideia com o Fernando para treinar com ele, ele foi super sincero comigo, porque eu não estava nem perto do nível da equipe dele. Ele disse que eu teria que ralar muito para chegar no mesmo nível, mas que, se eu quisesse, eu ia conseguir”, relembrou Mafê Costa, em entrevista à Folhapress, no último mês de fevereiro.
Possenti, por sua vez, percebeu a determinação de Maria Fernanda. "O que falta muito no esporte competitivo é tomar decisão, no sentido de 'estou disposto a pagar o preço de chegar bem, não chegar para participar.' E ela [Mafê] foi muito incisiva. Ela falou: 'É isso que eu quero.' Tem certeza? Sabe o preço que você vai pagar? 'Sei, é isso que eu quero.' Uma menina com uma decisão dessa não pode ficar perdida no mundo da natação. Ela precisa ter um apoio, ter um suporte. Foi isso que a gente quis dar pra ela. E ela aproveitou ao máximo, chegou aonde chegou e ainda vai muito longe", contou Possenti, ao ge.globo.
Na opinião de Possenti, faltava um olhar mais voltado àquilo que a atleta precisava. Outro ponto importante foi a divisão de responsabilidades com os demais membros da comissão técnica, para que a nadadora tivesse uma percepção mais integrada do trabalho. Segundo suas palavras, uma “noção de profissionalismo que ela não tinha”. E, mesmo com o inegável crescimento recente, há mais margem de evolução.
"Ela tinha muito potencial e não era explorado", afirmou o técnico, em entrevista recente ao Sem Limites, talk show do Olimpíada Todo Dia. "Ela acreditou no processo. Quando foi questionada se ela entendia como aquilo ia funcionar, o preço que ela ia ter que pagar, ela acreditou piamente no processo.”
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Mafê adotou uma nova rotina de treinamentos. Deixou de lado o nado borboleta para focar no crawl. Viu o seu padrão se elevar em pouquíssimo tempo. "Eu amava treinar o borboleta, pra ser sincera. Eu treinava melhor borboleta do que crawl, na época. Quando eu cheguei no Fernando, mudar tudo foi bem difícil para mim", contou Mafê, ao COBcast, em março. "Mas eu tô bem feliz com meus resultados no crawl, então não tenho o que reclamar. O borboleta ficou pra segundo plano e não me arrependo."
Mafê Costa voltou ao Troféu Brasil 2023 para conquistar o ouro nos 200m borboleta, mas não parou por aí. A prova virou só um adendo. Mafê ganhou o ouro nos 200m livre e a prata nos 400m livre, apenas seis décimos abaixo de Gabrielle Roncatto, que bateu o recorde brasileiro na ocasião. Ainda chegou à final dos 800m livre, com a sétima colocação. Já o Troféu José Finkel 2023 reafirmou que o momento de Mafê realmente se transformara: faturou ouros nos 200m livre, 400m livre e 200m borboleta, além da prata nos 100m livre.
A ascensão meteórica leva Mafê à vitrine internacional
O Campeonato Mundial de Esportes Aquáticos 2024 ofereceu um passo além para Mafê Costa. A nadadora competiu no Mundial Júnior 2019, uma experiência importante para perceber melhor o nível da natação mundial e focar mais nos treinos. Todavia, os Jogos Olímpicos não seriam uma realidade imediata. Ela teve problemas de saúde em 2020 e levou um tempo para se firmar no cenário internacional.
A primeira grande chance veio no Mundial de Esportes Aquáticos 2023, mas com uma participação tímida: Mafê terminou com o 20° melhor tempo na qualificatória dos 200m livre e com o 12° nos 400m livre. Sua primeira final aconteceu no revezamento 4x200m livre, em que a equipe brasileira terminou na oitava posição.
Os Jogos Pan-Americanos 2023 garantiram uma nova oportunidade para Mafê competir além das fronteiras e ela aproveitou a competição. Foram três medalhas de prata: nos 200m livre, nos 400m livre e no revezamento 4x200m livre. Santiago permitiu um aperitivo para a jovem, diante do objetivo de estar presente nos Jogos Olímpicos.
Então, o ápice de Mafê se deu no Mundial de Esportes Aquáticos 2024. O Brasil terminou sem medalhas, mas a nadadora conseguiu feitos inéditos. Além de quebrar dois recordes sul-americanos em provas individuais, também teve o melhor desempenho em ambas para o Brasil em Mundiais. O pódio não veio por detalhes: mais precisamente, por 47 centésimos nos 400m livre e por 85 centésimos nos 200m livre.
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"Eu estou feliz com o resultado. Espero melhorar até as Olimpíadas", afirmou Mafê, depois da prova dos 200m, ao Sportv. "É uma prova em que eu tenho que melhorar muito os meus fundamentos. Não são nem um pouco comparados aos delas [as outras nadadoras], elas saem já na minha frente e eu tenho que aprimorar muita coisa. Mas isso é com o tempo, um passo de cada vez. Já quero voltar para o Brasil, treinar mais ainda para estar nessa final olímpica."
Já a equipe brasileira de revezamento 4x200m livre, em quarto lugar no Mundial 2024, terminou a 1s30 do bronze e também quebrou o recorde sul-americano. Mafê fez o melhor tempo do quarteto. Ainda deu para pegar outra final no 4x100m livre, com a sexta posição para o Brasil.
É verdade que o Mundial 2024 não esteve completo. As campeãs Olímpicas Ariarne Titmus e Katie Ledecky não participaram, bem como jovens em ascensão como Mollie O'Callaghan e Summer McIntosh. Mesmo assim, o parâmetro das adversárias era alto: Siobhán Haughey e Bingjie Li ganharam medalhas em Tóquio 2020, enquanto Erika Fairweather desponta no atual ciclo. Mafê sublinhou como não está distante das melhores. Pelo contrário, se aproxima delas cada vez mais.
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As inspirações de Mafê nas raias ao lado
Mafê Costa teve um incentivo dentro de casa para começar na natação. Não só dos pais, mas também da irmã Mariana Costa, três anos mais nova e que começou a participar até antes de competições. Mafê levou mais tempo para ingressar no alto rendimento. Tinha 14 anos e se viu incentivada pela Seletiva Olímpica do Brasil para os Jogos Olímpicos Rio 2016. Presenciar a luta das estrelas da natação brasileira em busca da classificação fez a adolescente se dedicar mais às piscinas.
Federada inicialmente pelo Fluminense, Mafê depois se transferiu ao Flamengo, onde fez sua transição das categorias de base ao nível adulto. Nesta época, tinha apoio do treinador Luis Provençano. Já em 2023, a carioca se tornou atleta do Unisanta. E a nadadora aproveita a estrutura do Parque Aquático Maria Lenk, onde o COB concentra os treinos da elite da modalidade.
Por lá, Mafê se acostumou a treinar num alto grau de exigência, inclusive com uma de suas inspirações nas piscinas: Gabi Roncatto, que a carioca passou a admirar desde aquela seletiva para a Rio 2016. A companhia vai além da concorrência nas finais dos 400m e da parceria no revezamento 4x200m. Gabi virou uma grande amiga e também foi decisiva para Mafê fazer parte do time treinado por Fernando Possenti.
"Quando o Fernando abriu a equipe dele para o pessoal da piscina, eu via a Gabi treinando, e ela é incrível, treina sempre muito bem. Eu via os treinos delas, mas era um nível consideravelmente distante para mim. Só que eu e a Gabi, a gente mora perto, eu pegava algumas caronas, e me incentivava. Falava para eu trocar uma ideia com o Fê, que todo mundo via potencial em mim”, comentou Mafê, em entrevista à Folhapress.
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Mafê aponta que sua evolução parte do ambiente que encontrou na nova equipe. Quando chegou, a nadadora sentiu dificuldades pelo ritmo forte dos treinamentos. Conversou com Fernando Possenti e o treinador salientou como ela precisaria correr atrás e trabalhar duro para elevar seu nível. "O resto foi meio que fluindo, elas foram me puxando cada vez mais, foram me incentivando, sempre me ajudando", disse Mafê, ao COBcast, em março.
"Eu tenho até medo de falar muita coisa boa, o quanto eu estou feliz, e todo mundo achar que o processo é lindo, maravilhoso, cheio de flores. O processo é doloroso, é muito cansativo, mas eu acho que estar na minha equipe, ver todo mundo passando mal junto comigo, no mesmo barco, todo mundo fazendo o que gosta, o que ama, tentando estar numa Olimpíada, isso nos inspira muito. Quero evoluir junto com elas sempre", apontou também Mafê, à Folhapress.
A Seletiva Brasileira serve para Mafê Costa ratificar seu lugar em Paris 2024. Embora os índices Olímpicos já obtidos ofereçam uma salvaguarda, as regras da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA) determinam que eles sejam repetidos na final do qualificatório. A vaga em Paris 2024 estará confirmada se, além de fazerem a marca, os atletas se garantirem entre os dois primeiros da prova nacional.
Para quem está acostumada a competir em alto nível até mesmo nos treinos, e brilhou no Mundial, a Seletiva não parece um desafio tão grande para Mafê - ainda que a concorrência seja dura, inclusive nos 200m livre. Ela poderá dar uma nova demonstração de seu desenvolvimento, quem sabe com novos passos para melhorar seus tempos em busca dos Jogos Olímpicos.
É como avaliou Fernando Possenti, ao Olimpíada Todo Dia: "Precisa aprimorar ainda os fundamentos? Precisa. Onde está o gap de melhora dela hoje? Ela precisa melhorar a saída, ela precisa melhorar o breakout depois da virada. Ela tem ainda que melhorar os fundamentos que os velocistas têm muito bons. Se ela quiser nadar as provas mais rápidas, ela ainda tem esse gapzinho de melhora. Mas está no caminho." Um caminho que tem Paris 2024 apontando no horizonte.