O time por trás dos campeões: a lenda do biatlo Ricco Gross mostra aos austríacos que os Jogos Olímpicos são mais que esqui alpino

A lenda do biatlo estimula uma nova geração de atletas para Pequim. Sua filosofia de treino? “Quando vencemos, vencemos juntos. Quando perdemos, perdemos juntos.”

6 minPor Marina Dmukhovskaya
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(2012 Getty Images)

Se você já assistiu ao biatlo nos Jogos Olímpicos, você deve saber que o ápice de cada corrida acontece na hora dos tiros. Enquanto o atleta se prepara para atirar, as câmeras geralmente focam nos treinadores atrás dos alvos. Essa imagem dos treinadores nervosos mostra perfeitamente o drama do biatlo: alguns cerram os punhos, outros fazem um dramático 'facepalm' se as coisas dão errado. Uma pessoa bem popular nessa situação é Ricco Gross, um lendário atleta que virou treinador.

O ex-biatleta alemão - que agora veste o uniforme da Áustria - é o foco de hoje da série O time por trás dos campeões, que mostra o importante papel do staff na preparação para os Jogos de Inverno Beijing 2022. Você pode também conferir nossa matéria com o especialista em lâminas da patinação em pista curta Laurent Daignault.

(Getty Images)

Como tudo começou

Gross tem praticado biatlo por mais de 40 anos. Nascido na Alemanha Oriental, ele começou no esqui cross-country. Um dia o técnico de biatlo Jorg-Peter Deckert visitou a equipe de cross-country e perguntou se alguém gostaria de treinar tiros. Gross mudou para um novo esporte sem olhar para trás. "O tiro é uma experiência tão linda. Foi muito animador." O alemão admite que o início da carreira foi uma série de "competições ruins", com as únicas chances de medalha no revezamento.

O primeiro sucesso veio aos 18 anos, quando ele ganhou uma medalha no primeiro Campeonato Mundial juvenil. No nível juvenil, Ricco Gross trabalhou com o famoso treinador Klaus Siebert, que teve um profundo impacto nele como atleta, futuro treinador e também como pessoal

"Ele foi mais do que um treinador. Quando você é jovem, você quer ter uma vida longe do esporte, ir a uma boate, por exemplo. Se alguém dissesse a ele [Klaus Siebert] que um atleta estava chegando tarde na base, ele tinha certeza que era Ricco. Ele era como um pai, sempre me ajudando em situações estúpidas."

Os dois técnicos, Decker e Siebert, fizeram Ricco Gross se tornar um atleta excepcional, que faria história ao ser o único biatleta a ganhar quatro títulos de revezamento Olímpicos, competindo com lendas como o norueguês Ole Einar Björndalen e o francês Raphaël Poirée.

Ricco GROSS

Alemanha 
Biatlo
4O
3P
1B

Mudando de carreira

Depois de se aposentar da carreira como atleta, Gross colocou seu rifle e esquis de lado e... voltou para a escola. Ele entendeu a importância do conhecimento teórico em treinar e se juntou a um programa acadêmico de educação para treinadores em Colônia.

É esse conhecimento teórico e experiência incrível como atleta que fizeram Gross se destacar.

"Sei o que o atleta sente durante os últimos cinco tiros em competições importantes. Sei o que o atleta sente no começo da corrida se ele ouve no primeiro tempo que ele está 15 segundos atrás do líder."

Antes dos Jogos Olímpicos PyeongChang 2018, Gross decidiu levar sua fórmula de sucesso para o exterior: ele trabalhou primeiramente como treinador principal do time do ROC, depois para a equipe austríaca. O tetracampeão Olímpico encara sua jornada como treinador internacional como um aprendizado.

"Nunca pense demais sobre a nova situação. Só faça. Se você tem a chance de trabalhar para outro país, aprenda. Não a língua, mas como funciona."

Gross também falou sobre sua missão como técnico. "Meu objetivo é ajudar um atleta a evoluir, passo a passo. Olhe para os tempos de tiro de Simon Eder. Ele era super rápido antes. É um pouco mais lento, mas muito mais seguro."

A chave para ter sucesso como treinador? Gross foca na confiança de um relacionamento atleta-técnico. "O mais importante é que o atleta confie em você. Você é responsável por um plano de treinamento de um ano, de mês a mês, semana a semana. Você precisa considerar como os atletas estão se sentindo, se estão cansados ou não. Às vezes encontramos situações complicados. Se eu digo que um certo treino duro é importante para o resultado, eles seguem minha palavra."

Imaginando as pistas de Pequim

Além da rotina diária de treinos, Gross também passa muito tempo trabalhando com a preparação mental dos atletas.

"Passamos por cenários diferentes com os atletas que pensamos nas melhores soluções: atirar rápido ou ser mais seguro, começar um final forte não nos últimos 200 metros, mas 2km antes."

Esse processo parece ser mais importante do que nunca, com muita incerteza e detalhes pouco familiares sobre as pistas de Pequim.

"Não houve Copa do Mundo em Pequim ano passado, então é uma situação nova para todos. Ninguém conhece as pistas ou o local dos tiros. Vimos alguns vídeos, mas não é a mesma coisa."

Por que uma medalha do biatlo é importante na Áustria

Não é uma surpresa que a pressão Olímpica no time da Áustria é grande: desde que Gross se juntou à equipe, eles têm ganhado medalhas no Mundial a cada temporada.

Uma das maiores esperanças de medalha é uma disciplina relativamente recente no programa Olímpico: o revezamento misto do biatlo.

"No biatlo, temos um formato de competição interessante: o revezamento misto, quando os homens e as mulheres competem juntos. Tivemos um bom sucesso ano passado com a medalha em Pokljuka. Todo mundo vê que há uma grande chance para nós nessa prova e queremos essa medalha."

Gross também comentou as chances individuais.

"Temos Julian Eberhard, um dos esquiadores mais rápidos no circuito da Copa do Mundo. Se ele acertar os alvos, há uma grande chance para ele. Há um biatleta mais jovem, Felix Leitner, que fez seu primeiro pódio na última temporada. Para o nosso veterano Simon Eder, uma medalha é possível todas as competições se ele atirar bem. Achamos nossos quarto atleta para o revezamento ano passado, David Komatz. Ele é muito focado e tem muito potencial."

Quando pergunto como é a sensação de ir aos Jogos Olímpicos com a palavra "coach" em sua credencial, com os outros apenas assistindo, Gross deu uma resposta honesta.

"Quando eu competi, era só seu ganhando ou perdendo. Agora, se vencermos, vencermos juntos. Se perdermos, perdemos juntos."

Para um país tão focado em esqui alpino, ganhar uma medalha (ou mais!) no biatlo é importante para trazer atenção ao esporte. Se na equipe austríaca conseguir reviver o que o seu mentor fazia, o biatlo tem uma boa chance de ganhar o coração do país.

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