Laura Miccuci e Gabi Regly comentam a dura rotina do nado artístico: 'É mais que um balé aquático'
Integrantes do dueto brasileiro, em busca de vaga Olímpica para Paris 2024 no Pan 2023, querem quebrar estigma de que o esporte é meramente um 'hobby'. Com oito horas diárias de treinos e água fervendo para tirar a proteção de gelatina no cabelo, elas se adaptam às novas regras e buscam consultorias para ir mais longe.
Para a maioria dos esportes, uma boa noite de sono antes de uma grande competição é mandatória. Mas isso nem sempre é possível no nado artístico. As atletas muitas vezes precisam acordar no meio da madrugada para iniciar todo o ritual de colar o próprio cabelo com gelatina.
"Dá até dor de cabeça", disse Gabriela Regly, integrante do dueto brasileiro nos Jogos Pan-Americanos Santiago 2023, ao Olympics.com. “Só consegue tirar [a gelatina] depois com água fervendo. Se botar água neutra, não tira”, completou sua dupla Laura Miccuci.
Dentro da piscina, também não tem moleza. As brasileiras treinam arduamente, em busca da excelência técnica, física e artística.
“As pessoas perguntam se é o esporte que dança na água. Isso me revolta um pouco. É mais que só colocar a perna para cima ou um balé aquático”, afirmou Gabi. “Ficam chocados quando descobrem que a gente treina oito horas por dia. Treinamos mais que muitos esportes coletivos. Precisa ser perfeito.”
A cada rotina na água, as nadadoras provam que são mais fortes do que quem as subestima ou as objetifica.
"Queremos quebrar esse tabu. No esporte em que a mulher predomina, acham que é brincadeira, que é hobby. Mas é nossa profissão, nosso esporte”, disse Laura. “Temos que mostrar leveza, a arte com suavidade na piscina. Mas é muito cansativo. Não é treininho.”
Dueto brasileiro faz consultoria com treinadora japonesa campeã
Esporte que até 'mudou de nome' recentemente, o nado artístico vem implementando diversas novidades, como a inclusão dos homens nos Jogos Olímpicos de maneira inédita em Paris 2024.
“A gente tem mais experiência do que os homens, por eles terem entrado no esporte depois. Mas eu aprendo muito com eles. Aprendi a usar a força, porque eles têm uma propulsão muito maior que a nossa para se deslocar na água”, contou Gabi, que já participou de rotinas acrobática mista.
“Temos as alçadas [movimento de se levantar para a superfície da água] no nado. Se você coloca o homem embaixo da alçada, ele sai muito mais alto. Então é algo que contribui para o esporte no geral”, acrescentou.
Outra mudança bem-vinda para as brasileiras é no sistema de pontuação, que se tornou menos subjetivo a partir de 2022.
“As regras mudaram radicalmente e ficou bem imprevisível o resultado. Dá um pouco de esperança de conseguir sair do resultado que a gente sempre tinha meio parecido”, afirmou Laura.
Em relação ao Mundial de Fukuoka neste ano, Laura e Gabi mantiveram a rotina técnica que rendeu o 15° lugar e decidiram mudar a rotina livre (16°) após consultoria com a treinadora japonesa Mayuko Fujiki, que levou a Espanha ao topo do esporte.
“No Mundial, fomos muito bem no técnico e não muito no livre. A gente entendeu que precisava trabalhar no livre”, explicou Gabi. “Escolhemos uma música francesa pensando em Paris”, revelou Laura.
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Laura Miccuci e Gabi Regly: transformando obstáculos em caminhos
Em Tóquio 2020, o Brasil ficou de fora do nado artístico por uma vaga. Laura, que fazia parte do dueto que tentou a classificação, ganhou ainda mais força para lutar pelo seu objetivo.
“Queria muito ter conseguido ir para Tóquio, mas isso não me desanimou. Pelo contrário, me motivou, porque chegamos até o final. Você pensa ‘preciso conquistar isso na minha carreira’. O sonho de todo atleta é ir para uma competição como a Olimpíada”, comentou.
Tanto Laura quanto Gabi são irmãs de atletas do nado artístico, Maria Eduarda Miccuci e Bia Almeida, respectivamente. Na família, elas encontram forças para lidar com todos os obstáculos.
“Ela me ensinou a não desistir, independente de qualquer obstáculo. Transformar obstáculos em um caminho, em esperança. Já quebrei quatro vértebras da coluna e o meu primeiro pensamento foi que eu não ia ser mais ninguém no nado. Mas minha irmã o tempo todo disse que eu tinha que acreditar, que eu ia conseguir. Usei aquilo como uma escada para onde estou hoje”, contou Gabi.
“Minha irmã conquistou tudo que eu quero conquistar. Ir para uma Olimpíada, para uma final Olímpica. A gente sempre troca bastante quando estou meio para baixo, cansada. Elas sabem o que a gente passa”, complementou Laura.
Em busca da única vaga de dueto em disputa no Pan 2023, elas entendem a responsabilidade, mas também são fortes para encarar o resultado, qualquer que seja.
“Se a gente não conseguir a vaga no Pan, vamos nos motivar para conseguir em Doha”, garantiu Gabi, falando sobre o Mundial de 2024.
“O maior receio do atleta é o fracasso, nosso maior medo. Mas quando você sabe que está no caminho certo, não tem essa sensação”, finalizou Laura.
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