Da inatividade à Copa do Mundo: como a seleção feminina de futebol da Jamaica ressurgiu em menos de 10 anos 

Terceiro e último rival do Brasil na primeira fase chegou a deixar o ranking da FIFA por não entrar em campo, mas hoje disputa o segundo Mundial consecutivo graças ao apoio de uma das filhas de Bob Marley e outras celebridades.

5 minPor Daniel Perissé
Jamaica players celebrate the scoreless draw in the FIFA Women's World Cup Australia & New Zealand 2023 Group F match against France
(Robert Cianflone / Getty Images)

Quem viu o empate sem gols entre Jamaica e França, pela primeira rodada do grupo F da Copa do Mundo Feminina 2023 não imagina que o país caribenho, que conquistava ali seu primeiro ponto na história da competição, chegou a deixar o Ranking da FIFA por falta de atividade há cerca de dez anos.

A Jamaica fixou de vez seu nome no cenário do futebol em 1998, quando a equipe masculina comandada pelo brasileiro René Simões conseguiu a inédita classificação para o Mundial daquele ano, na França. As chamadas "Reggae Girlz" só conseguiram sua vaga pela primeira vez em 2019 - e onde foi disputada a Copa do Mundo daquele ano? Também em território francês.

Porém, antes disso acontecer a equipe feminina jamaicana precisou passar por muita coisa, o que inclui não ter uma seleção de futebol feminino entre 2010 e 2014. Atualmente na posição 43 do Ranking da FIFA, a Jamaica chega à sua segunda Copa do Mundo Feminina consecutiva, e é o primeiro país do Caribe a conseguir tal feito.

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O Olympics.com conta um pouco mais sobre a Jamaica, adversária do Brasil no próximo dia 2 de agosto no Melbourne Rectangular Stadium, em partida que fecha a participação de ambas na primeira fase.

Apoio de uma das filhas de Bob Marley

O futebol feminino surgiu na Jamaica em 1991, quando as "Reggae Girlz" fizeram seu primeiro amistoso internacional, uma derrota por 1 a 0 para o Haiti. Desde então, a equipe se consolidou como uma das forças da região.

No entanto, após não conseguir a classificação para a Copa do Mundo Feminina de 2003 e para o torneio Olímpico de Beijing 2008, a federação local cancelou os programas destinados às seleções principal e Olímpica. Do posto 128 no Ranking da FIFA, a nação acabou retirada.

Isso durou até 2014, quando Cedella Marley, uma das filhas do famoso cantor de reggae Bob Marley, estava em casa quando recebeu de seu filho um panfleto do treinador de futebol da escola dele: era um pedido de ajuda à federação local.

Na manhã seguinte, ela telefonou para a entidade e ouviu que todas as áreas precisavam de apoio, como viagens, alimentação, campos de futebol e locais para treinos.

Integrante da banda Ziggy Marley and the Melody Makers, ela chamou alguns de seus irmãos e escreveu a música "Strike Hard" (ataque com força), cujos royalties foram destinados ao desenvolvimento do futebol no país. Com essa iniciativa e outras, tais como uma página para angariar fundos, ela se tornou embaixadora e patrocinadora da seleção feminina.

No primeiro ano, foram arrecadados nada menos que 300 mil dólares para apoiar os programas. Em 2014, o país retornou às competições e não conseguiu vaga ao Mundial Feminino de 2015, o que gerou uma nova debandada na temporada seguinte.

Entretanto, os esforços valeram a pena em 2019, quando a Jamaica se tornou o primeiro país do Caribe a garantir presença em uma Copa do Mundo Feminina. Apesar de ter perdido todos os seus jogos - inclusive para o Brasil -, a semente estava plantada.

"O futebol pode mudar a vida delas. Tudo o que elas precisam é de ter uma estrutura decente. Tenho tido sorte, mas não é fácil fazer o que eu faço. Essas garotas merecem cada oportunidade que possamos dar a elas," comentou Cedella, que hoje já conta com alguns patrocinadores, em entrevista ao site da CNN.

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Destaque joga no Manchester City

A principal jogadora da seleção jamaicana é fruto desse desenvolvimento iniciado por Cedella Marley. A atacante Khadija Shaw, hoje com 26 anos, saiu das equipes de base (sub-15, sub-17 e sub-20) para estrear na seleção principal em 2015, quando ainda tinha 14 de idade.

Ela fez carreira no futebol universitário dos EUA e fez parte da seleção que conseguiu a histórica vaga para a primeira Copa do Mundo, em 2019. Naquele mesmo ano, assinou com o Bordeaux, da França, pelo qual marcou 34 gols em 39 partidas.

Em 2021, Shaw foi anunciada como reforço do Manchester City e, por enquanto, já balançou as redes nada mais que 50 vezes em 58 jogos. Em maio, ela teve seu contrato renovado com o time até 2026.

“Quando eu era mais nova os meus pais não me deixavam jogar por causa da falta de oportunidades. Um dia eu disse a eles para fazermos um trato: eu passo nas minhas provas e vocês me deixam jogar. Passei e fui convocada para a seleção sub-15. Eu falei à minha mãe que talvez eu fosse a pessoa que mudaria o futebol feminino na Jamaica, contou a atacante à BBC Sport.

De fato, na seleção ela é capitã, líder e referência. Apelidada de “Bunny” por adorar cenouras desde a infância, por ela passarão as chances ofensivas das jamaicanas diante do Brasil - Shaw foi expulsa nos acréscimos da partida diante da França e desfalcará a seleção contra o Panamá, adversário da segunda rodada.

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