Flag Football do Brasil: maior do que você imagina
Modalidade é novidade no programa de LA28, jogada no país desde o fim dos anos 90. Para saber sobre as oportunidades que os próximos Jogos apresentam para o esporte no Brasil, o Olympics.com conversou com a fotógrafa Grasiela Gonzaga, ex-atleta e gestora. Confira.
O flag football é uma das novidades do Programa Olímpico para LA28. Influenciada pelo futebol americano (FA), é praticada no Brasil desde o final dos anos 90, antes apresentada para iniciantes no esporte, ou como uma alternativa para quem não quisesse o contato físico.
Contexto este de Grasiela Gonzaga. Em 2009, interessada no FA, a designer paulistana teve o primeiro contato com a bola oval através do flag football.
Ficou longe dos capacetes e ombreiras. Está no flag até hoje, esporte que entra em seu primeiro ciclo Olímpico de sempre.
Mas o qual é o tamanho do flag football no Brasil?
Quando começou a praticar, Grasiela já encontrava um cenário de diversas equipes e competições pela capital e interior paulista. A modalidade inclusive já havia sido levada pelos professores Cláudio Telesca e Paulo Arcuri – também responsáveis pela primeira seleção brasileira masculina, em 2001 - para centenas de crianças da rede pública de ensino de São Paulo.
Mas, diferente do futebol americano, o flag era marginalizado e feito no improviso. “Tudo era decidido e organizado através de grupos de facebook”, conta Grasiela.
Em nível internacional, não. O flag já era realidade para dezenas de países com seleções nos dois gêneros, em Mundiais organizados pela IFAF (International Federation of American Football – Federação Internacional de Futebol Americano).
Em 2011, a entidade enviou convite que transformaria o flag football do Brasil e a vida de Grasiela Gonzaga.
Já se vai mais de uma década em que ela testemunha a realidade e crescimento do esporte. Também fotógrafa, ela foi atleta e gestora da seleção feminina.
A fim de saber o tamanho do flag football no país e as oportunidades Olímpicas que LA28 oferecem, o Olympics.com foi querer saber mais e conversou com a Grasiela. Confira.
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A formação da primeira seleção feminina, em 2012
Com um plano de expansão para mais países, em 2011 a IFAF enviou convite para que o Brasil participasse da sexta edição do Mundial de Flag Football do ano seguinte, 2012, em Gotemburgo (Suécia).
Já envolvida com a organização do esporte, Grasiela Gonzaga tratou o convite com carinho. Ao seu lado, contou com Éder Sguerri, atleta do futebol americano e entusiasta que viu no flag uma oportunidade de levar a bola oval para muito mais pessoas e regiões do Brasil.
“Estar em Mundiais era uma forma de afirmar o esporte para quem já era do flag e levar para quem estava fora dele”, diz Grasiela. “O primeiro [campeonato] Brasileiro, se eu não me engano, foi em março de 2012 e em agosto a gente estava jogando o Mundial. O Éder abraçou a ideia e trabalhamos para organizar a primeira seleção feminina, que foi para Gotemburgo.”
Na Suécia, o Brasil terminou o seu primeiro Mundial em último lugar. Grasiela era a chefe da delegação e acompanhava tudo à beira do campo. Em uma das partidas, debaixo de forte chuva, ela se lembra que o então presidente da IFAF, Tommy Wilking, se aproximou e disse: “Você não sabe a importância de o Brasil estar aqui hoje. Estamos vislumbrando um futuro promissor para o flag, inclusive nos Jogos Olímpicos.”
Uma mensagem que fez eco por vários anos no ouvido de Grasiela, que tratou de contagiar toda a comunidade do esporte. “A gente não sabia nada que estávamos fazendo, então vamos focar e evoluir”, relembra.
A seleção feminina voltou aos Mundiais seguintes e cresceu nos resultados – 10º em 2014, 6º em 2016 e também em 2018. A melhor colocação da história foi o quarto lugar, em 2021. Na última edição, na Finlândia, em agosto de 2024, as brasileiras acabaram em nono lugar. “Se tivesse mais uma posse de bola, talvez a gente teria ganhado esse jogo”, comenta Grasiela sobre a partida válida pelas oitavas de final, contra a Áustria, em derrota por 34 a 32.
Atualmente, a equipe está em 13º lugar do ranking mundial.
Anos antes, em 2018, ela estabeleceu um site (Flag Football Brasil) para reunir todas as informações sobre a modalidade no país: notícias, equipes, regulamentos e seleções nacionais. “Não dava para se organizar por grupos de facebook. Vamos fazer um site e vou colocar em prática tudo o que eu sei para levar o flag adiante.”
O restabelecimento da seleção masculina para o Mundial de 2021
Outrora marginalizado, o crescimento e os resultados do flag nacional passaram a chamar mais a atenção do público, com mais homens praticando. No entanto, a seleção brasileira masculina só participou do seu primeiro Mundial organizado pela IFAF em 2021. Ficou em 17º lugar entre 21 times.
Se o resultado em campo não foi bom, fora dele o resultado foi ótimo.
No bate-papo, Grasiela resgata a estreia dos brasileiros em Mundiais: “Ali a galera entendeu o que era um Mundial de flag football. Então ali foi o boom da seleção e dos campeonatos masculinos. Um absurdo. O [campeonato] Brasileiro costumava ter 20, 25 equipes. Neste ano a gente teve 80!”
A rejeição que havia com o flag passava a ser cada vez menor. “Antes eles queriam o contato físico do FA. No início da seleção masculina de flag, a gente não tinha ninguém que jogava futebol americano. Já nessa seleção [do Mundial] de 2024, vários são atletas também de FA.”
Internacionalmente, o flag football se consolidava. Nos bastidores, continuava o trabalho para torná-lo Olímpico.
A realidade Olímpica para o flag football do Brasil
“Na verdade, a gente sempre ouviu que se algum dia o futebol americano virasse Olímpico, seria por meio do flag”, lembra Grasiela.
“A gente estava nessa expectativa, confiante de que ia acontecer isso. E na verdade, acho que isso é um objetivo de todo mundo que vive o flag há tanto tempo, né? É difícil, a gente sofre, mas a gente se diverte e é por um bem maior. A gente dizia: ‘isso aqui ainda vai valer a pena, vai ser grande e tudo mais.’ Então foi uma grande emoção quando do anúncio que ele estaria em Los Angeles em 2028. É um sonho sendo realizado.”
O futuro é promissor, mas Grasiela sabe que há muito para ser feito: “O que sustentou o flag nesse tempo todo, enquanto a gente não tinha esse vislumbre Olímpico, foi mesmo a questão da comunidade, de você estar ali jogando um negócio que não são todos que sabem o que é.”
Estar presente no programa dos Jogos vai fazer com que as federações nacionais se organizem mais em termos de formação e desenvolvimento, o que reflete no alto-rendimento. Sem falar nas competições nacionais.
“Vai ficar cada vez mais difícil, o cenário está cada vez mais competitivo”, diz. “A Itália, por exemplo, em 2021 a gente ganhou delas de maneira tranquila. Chegou no World Games [2022], em coisa de seis meses, contrataram técnica americana que mudou o jogo delas e ganharam da gente”, acrescenta.
“Vamos ter bastante trabalho para conseguir uma vaga Olímpica. Esses quatro anos vão ser bem puxados”, prevê.
O tamanho do flag football no Brasil
Segundo levantamento de Grasiela, existem no Brasil cerca de 170 equipes de flag football, nos dois gêneros. Isso corresponde a um universo de 5000 atletas (nas categorias de base e adulta), sendo o número de homens três vezes superior ao de mulheres.
A modalidade está distante do profissionalismo dos seus praticantes, que arcam com os custos de toda a sua organização. Por outro lado, está presente em quase todas as unidades da federação, com exceção do Amapá, Acre e Alagoas.
Para uma modalidade ainda pouco praticada, cada oportunidade no calendário precisa ser bem aproveitada. “A gente tem bons campeonatos, mas a gente precisa de mais. A gente disputa o campo de futebol. As pessoas não querem um gramado desgastado. No entanto, acaba acontecendo isso [de desgastar o gramado], porque um campeonato de flag e é um dia todo com 15 jogos”, argumenta Grasiela.
Internacionalmente, as grandes potências são os Estados Unidos e o México. “Eles estão cinco degraus acima de qualquer outra seleção”, explica. Depois deles vêm Canadá e Áustria.
Grasiela: “Tem sido uma evolução absurda do esporte no país”
Grasiela espera que o flag football atraia mais torcedores e praticantes: “O fato de ser um esporte mais conhecido vai chamar mais gente, com certeza absoluta.”
Muito antes de ser Olímpico, a paixão de Grasiela pelo flag foi potencializada pelo sentido de comunidade que a modalidade proporciona, de um aprender com o outro. Um ambiente em que todos se ajudam, em um raro espírito coletivo.
“Um campeonato de flag é um final de semana inteiro que você passa ali, todas as equipes juntas. Então isso favorece muito essa construção de relacionamentos, de comunidade. Isso mudou a minha vida.”
Quer seja em campo ou fora dele, Grasiela assim resume o flag football do Brasil: “Tem sido uma evolução absurda do esporte no país em todos os níveis. E é muito gostoso fazer parte disso.”
“Meu próximo objetivo de vida é estar em Los Angeles”, terminou.