João Victor Alves Sena: único a vencer Jogos Olímpicos da Juventude e Copa do Mundo no futsal
Modalidade foi disputada em Buenos Aires 2018, com o Brasil sendo campeão do torneio masculino. Em 2024, ele ajudou o país na conquista do hexacampeonato em Copas. O Olympics.com conversou com o craque brasileiro, que sonha em ver o esporte no programa dos Jogos.
São bem poucos os atletas que foram ao topo do pódio nos Jogos Olímpicos. Menor ainda é o número daqueles que também somam no currículo um título mundial. Inversamente proporcional é a quantidade dos que sonham com estes títulos.
Ainda mais em esporte que é um dos mais jogados do planeta.
O futsal não é parte integral do calendário Olímpico de Verão, cuja próxima edição será LA28. No entanto, a modalidade esteve no programa dos Jogos Olímpicos da Juventude em Buenos Aires 2018. Ou seja, foi disputado apenas uma vez.
Desta única vez, o Brasil venceu o torneio masculino. O fixo João Victor Alves Sena, também conhecido como “Neguinho”, era o capitão daquele time que obteve o título na capital argentina.
“É um ouro muito importante. Só 10 jogadores da modalidade têm essa medalha e é um dos esportes mais praticados no mundo inteiro. Somos privilegiados por termos sido campeões, algo marcante porque foi raro, foi só aquela vez [Buenos Aires 2018] que teve”, disse João Victor. “Tem tantos bons atletas que já venceram tudo, mas não a conquistaram [a medalha em Jogos Olímpicos da Juventude]”, acrescentou.
Seis anos mais tarde, João Victor foi um dos destaques do Brasil na conquista do hexacampeonato da Copa do Mundo masculina de futsal da FIFA, no Uzbequistão. O único remanescente daquele elenco vencedor em Buenos Aires 2018. Ao se dar conta de que, aos 24 anos de idade, é campeão em Jogos Olímpicos da Juventude e em Copas do Mundo, ele confessa: “É difícil colocar em palavras o que isso significa. Só tenho a agradecer a Deus.”
O Brasil ainda comemorava o hexa nas quadras, quando a Federação Internacional de Futebol (FIFA) divulgou que trabalha para a inclusão do futsal no programa Olímpico. Uma iniciativa há muito aguardada pelos fãs deste esporte cujas raízes estão na América do Sul. Uma altura para conhecer João Victor Alves Sena, o brasileiro que é único na modalidade: o raro campeão em Jogos Olímpicos da Juventude e também em Copas do Mundo, quem o Olympics.com entrevistou abaixo.
Um talento do futebol, no campo ou na quadra
Densamente povoado e localizado no extremo leste da cidade de São Paulo, o Itaim Paulista apresenta inúmeros desafios urbanos a fim de proporcionar mais oportunidades para os seus moradores. Entretanto, enquanto jovem João Victor não precisou sair de lá para se destacar no que sabe fazer melhor: jogar futebol.
Foi no Clube da Comunidade (CDC) Jardim das Oliveiras que deu os primeiros chutes, no campo e nas quadras. Revelou-se um talento para a bola, o que chamou a atenção do tradicional Clube Esportivo da Penha, também na Zona Leste paulistana. Lá, sentia-se em casa, o que fez recusar convites no futsal, como do Corinthians.
A opção por tentar a carreira profissional no campo o fez sair da região onde nasceu e foi criado. Acabou no outro lado de São Paulo, na Zona Oeste, na Barra Funda, para jogar no Nacional Atlético Clube. Era segundo volante. Mais tarde negociado com o Juventus, voltou para o lado leste da cidade: a Mooca.
“Eu tinha um empresário e eu estava começando. Ele me dava 300 reais por mês, mas aquilo não dava, não batia, não dava pra fazer nada. Aquilo foi me desanimando e desanimando cada vez mais, porque eu tinha muitos anos de contrato com o empresário”, revelou João Victor.
Este vínculo contratual deixava de fora o futsal, que não deixou de jogar mesmo dedicado aos gramados. Em março de 2018, foi campeão Sul-Americano sub-18 pela seleção brasileira, que obteve a vaga para os Jogos Olímpicos da Juventude, em Buenos Aires.
Meses depois, apareceu mais um convite para, de vez, vestir a camisa do Corinthians neste esporte. Insatisfeito e sabendo que teria mais oportunidades, era a opção que precisava para ganhar mais do que recebia.
Agora aos 18 anos, para poder tomar conta da sua própria carreira, trocou o campo pela quadra e mudou-se da Mooca para o Tatuapé.
“Sempre foi um sonho poder jogar no Corinthians, pela camisa, um time grande. Botei na cabeça: vou ficar nesse time, vou jogar no Corinthians”, disse.
O raro ouro dos Jogos Olímpicos da Juventude
Antes de tomar a decisão de jogar pelo futsal do clube de Parque São Jorge, João Victor já era bastante reconhecido na modalidade. Isso lhe rendeu a convocação para a seleção brasileira, no início de 2018 para o Sul-Americano sub-18, no Paraguai.
“Comecei no banco, mas entrei em um jogo difícil contra o Uruguai, ajudei o grupo e vencemos. Virei titular e depois fiquei capitão”, lembra-se.
O Brasil foi campeão e obteve a cota regional para disputar os Jogos Olímpicos da Juventude na Argentina, em outubro daquele mesmo ano. O futsal fez parte do evento em caráter de teste.
Entre os dez convocados para Buenos Aires 2018, João Victor foi designado capitão. “Claro, fiquei muito contente, já acompanhava as Olimpíadas e eu sabia que poderia ser só aquela vez [do futsal em Jogos Olímpicos da Juventude]”, comentou.
Na capital argentina, viveu o clima e a atmosfera da Vila dos Atletas, algo que o marcou muito: “Que estrutura, que cuidado! Parecia uma cidade, cada prédio com a sua bandeira, do Brasil, da França, a gente almoçava e jantava junto em um refeitório. E a estrutura foi surreal, fora a força dos times... [República Islâmica do] Irã é fortíssimo, Argentina, só time ‘top’.”
E foi justamente a semifinal do torneio masculino uma final antecipada contra a Argentina, a anfitriã. Perguntado sobre como lidou com a pressão da torcida, ele rebateu: “Pressão, não. É um privilégio. Eu trabalhei para aquilo. É aí que a pessoa tem que mostrar o seu valor. A gente entrou, foi vaiado, mas eu olhava tudo aquilo, sorria e pensava: ‘mano, que ‘da hora’ tudo isso’.”
João Victor fez o segundo gol do Brasil, abrindo 2 a 0 parcial. Apoiados pelos oito mil torcedores que lotaram o ginásio de Tecnópolis, os argentinos empataram em dois minutos. Pouco depois, Breno fez o 3 a 2 que colocou a seleção na decisão pela medalha de ouro.
Na finalíssima, contra a Rússia, um incontestável triunfo por 4 a 1. O Brasil ia ao topo do pódio no futsal dos Jogos Olímpicos da Juventude Buenos Aires 2018, liderado por João Victor: “Olhei para a medalha e ela é linda... está muito bem guardada até hoje. É um título muito importante, a gente vê aí tanto atleta que dá a vida para obter uma medalha, com anos de trabalho e sacrifício.”
Título da Copa e objetivo: ‘Quero ficar na história do futsal’
Hoje, João Victor sabe que aquela medalha em Jogos Olímpicos da Juventude ultrapassa o significado de uma conquista nacional. Era também uma afirmação de todo um planeta apaixonado pela modalidade: “Na época eu não fazia ideia disso, mas foi difícil incluir o futsal naqueles Jogos, talvez só haveria aquela oportunidade.”
“Somos privilegiados por termos sido campeões. Foi só aquela vez que teve", ressaltou.
Ao ser perguntado sobre o porquê o futsal deve estar no programa Olímpico de maneira integral, João Victor estava com a resposta na ponta da língua: “É um jogo que te prende até o final. Imprevisível, dinâmico, rápido, tudo pode acontecer. Ganhamos de virada a decisão da liga nacional de 2023 com 26 segundos para o fim!” Na ocasião, o clube em que atuava, o Atlântico (Erechim/RS), deu a volta no marcador para vencer o Joinville por 2 a 1.
O título em Buenos Aires 2018 firmou João Victor em sua carreira nas quadras. Depois de erguer a taça do principal campeonato do país em 2023, pelo Atlântico, cruzou oceano de mesmo nome para atuar pelo Palma, das Ilhas Baleares, na Espanha.
Em quadras espanholas, passou a enfrentar com mais frequência os melhores do mundo todo e encontrou um jogo mais rápido. Para ele “mais jogado”, com mais bola. Desenvolveu o seu estilo.
A adaptação e rápida evolução deixaram-no mais completo, sendo convocado para a Copa do Mundo masculina de Futsal FIFA, no Uzbequistão, entre setembro e outubro de 2024. Integrante do cinco inicial da equipe, fez quatro gols no torneio e ajudou o Brasil a obter o hexa, quebrando um jejum de 12 anos do país no torneio.
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Menos de um mês depois, voltou a estar no topo do mundo, mas desta vez com o seu clube, o Palma. A equipe faturou o bicampeonato Mundial de Clubes, em vitória sobre Sorocaba, por 4 a 1.
Uma carreira repleta de títulos, prêmios, marcas, cobiçados troféus e uma medalha que é única. Não há dúvidas de que João Victor está consagrado no mundo do esporte. No entanto, entre uma conversa e outra com seus colegas de trabalho, há sempre a dúvida e se pergunta: “Como o futsal ainda não é Olímpico?”
Talvez os deuses da bola estejam trabalhando para tal.
“Estamos aí na luta para que o nosso esporte seja incluído nos Jogos [adultos], quero ficar na história do futsal”, finalizou João Victor.