Paris dá boas-vindas ao mundo todo com uma inovadora Cerimônia de Abertura no rio Sena

Por Lena Smirnova
9 min|
A Torre Eiffel se ilumina com o show de luzes para a Cerimônia de Abertura dos Jogos Olímpicos Paris 2024
Foto por Pascal Le Segretain/Getty Images

Paris testemunhou vários momentos memoráveis na história -- alguns dos locais que receberão os Jogos Olímpicos Paris 2024 são prova disso -- mas a visão de 85 barcos transportando 6,8 mil atletas ao longo do rio Sena até uma cintilante Torre Eiffel e à pira Olímpica elevada por um balão de ar quente não é algo que a capital francesa provavelmente se esquecerá.

A Cidade Luz se tornou um estádio esportivo na noite da Cerimônia de Abertura Paris 2024, nesta sexta-feira (26 de julho). O rio Sena, com seu leito e suas margens, ganhou arquibancadas com torcedores. E marcos históricos pelo caminho viraram testemunhas silenciosas da celebração vibrante cheia de bandeiras, plumas e gotas de chuva.

Ao realizar a cerimônia pela primeira vez na história dos Jogos Olímpicos fora do cenário tradicional de um estádio, Paris 2024 convidou todos a participarem das quatro horas de festa, criada pelo diretor artístico Thomas Jolly.

Atletas saltaram no convés dos barcos sob chuva constante, torcedores se reuniram nas margens e pontes, bailarinos deram piruetas nos telhados e os parisienses saíram em suas sacadas para aclamar as delegações dos 205 Comitês Olímpicos Nacionais (CON).

O desfile no rio e as apresentações artísticas percorreram o coração de Paris rumo a Trocadero, onde o mundo se reuniu para ouvir as palavras mágicas do Presidente da França, Emmanuel Macron: "Eu declaro os Jogos Olímpicos Paris 2024 abertos."

"Alguns podem dizer que nós, no mundo Olímpico, somos sonhadores. Mas não somos os únicos," disse o presidente do Comitê Olímpico Internacional, Thomas Bach. "E nosso sonho está se tornando realidade nesta noite: uma realidade para todos verem. Atletas Olímpicos de todo o mundo, nos mostrando a grandeza que nós humanos somos capazes. Então eu convido a todos: sonhem conosco. Como os atletas Olímpicos, inspirem-se na alegria que apenas o esporte pode nos dar. Vamos celebrar este espírito Olímpico de viver a vida em paz, como uma única humanidade, unida em toda a nossa diversidade."

A pira Olímpica se eleva nos céus de Paris

Foto por Peter Cziborra - Pool/Getty Images

Seis quilômetros, 85 barcos: A primeira Parada das Nações em um rio

Emergindo de trás de uma fila de leques com penas cor-de-rosa e vestida para um cabaré, Lady Gaga deu o tom para a noite que estava por vir.

"Boa noite! Bem-vindos a Paris," a cantora e compositora gritou, depois de sua icônica apresentação da canção francesa "Mon truc en plume", para começar uma celebração inesquecível. E os atletas estavam prontos para atender ao chamado.

Começando na Pont d'Austerlitz, a flotilha da Parada das Nações começou sua jornada de seis quilômetros a oeste ao longo do Sena, passando sob pontes e por marcos reconhecidos mundialmente, como a Esplanade des Invalides, a Place de la Concorde, Notre-Dame e o Grand Palais, antes de chegar a Trocadero, do lado oposto da Torre Eiffel.

Misturados a esses marcos estavam os locais que receberão os atletas para as competições durante os próximos 16 dias e, para alguns, também o palco de seus maiores triunfos.

Mas, por enquanto, a competição não era a prioridade em suas mentes. A união era o sentimento da noite, com atletas de diferentes países celebrando em barcos compartilhados - Canadá e República Popular da China se misturando em um mar vermelho no mesmo convés, atletas de Mongólia, Montenegro, Moçambique e Mianmar encurtando as distâncias entre três continentes para se reunirem em um mesmo barco.

Mesmo os surfistas, que estão prestes a iniciar a competição no Taiti, se juntaram às festividades via link de vídeo desde a praia, vestidos com as roupas da Cerimônia e segurando tradicionais pranchas de madeira.

"Queridos atletas, mal podemos esperar para viver tudo isso com vocês. A alegria, as lágrimas e o amor que vocês colocam em cada momento. Obrigado por estarem aqui. Vocês conseguiram! Bravo! Eu sei o que isso significa. Eu sei o que foi preciso. Eu sei o caminho que vocês seguiram para estar aqui. Paris retribuirá a vocês. Esta é Cidade do Amor... e, pelos próximos 16 dias, esta é a sua cidade," disse Tony Estanguet, três vezes campeão Olímpico e presidente do Comitê Organizador Paris 2024. "Bem-vindos ao lar. Bem-vindos a Paris. Bem-vindos ao momento de vocês na história. Vivam isso. Amem isso e nos levem com vocês! O mundo está do lado de vocês."

Ópera, telhados, canhões e croissants: uma jornada eclética pela história e pela cultura da França

À medida que os atletas navegavam ao longo do rio através do centro de Paris, a história ganhava vida ao redor deles.

Dividido em 12 etapas artísticas e apresentado por 2 mil artistas, o fantástico show convidou os espectadores aos lugares mais icônicos de Paris e os trouxe à vida.

O passado e o presente se uniram de forma perfeita, como no capítulo 'Liberdade', em que uma cena operística de Les Miserables e disparos de canhões pela Conciergerie fluíram suavemente para uma celebração dos amantes de Paris em toda a sua diversidade.

Além da Pont Royal, o rio Sena se tornou um museu de arte, quando retratos presentes em obras-primas do Museu do Louvre emergiram parcialmente da água para cumprimentar os atletas, enquanto um portador da tocha mascarado voltou no tempo pelo corredor do museu para testemunhar o roubo da icônica Mona Lisa.

Um distinto toque francês esteve presente em toda a cerimônia. Alguns momentos foram um aceno para itens turísticos como boinas e croissants, enquanto outros saudaram o balé e a ópera de alta cultura.

A apresentação de "La Marseillaise" foi um momento particularmente de êxtase. A mezzo-soprano Axelle Saint-Cirel cantou o hino nacional francês em pé no telhado do Grand Palais, num vestido feito pela Dior que lembrava a bandeira do anfitrião, enquanto as estátuas de 10 figuras históricas femininas se erguiam ao lado da Assembleia Nacional -- uma sede do poder que anteriormente era decorada apenas com estatuas de homens transformadores.

Refletindo essa mudança, Paris 2024 verá paridade de gênero no terreno de jogo pela primeira vez na história dos Jogos Olímpicos.

Uma festa para todos: dando as boas-vindas aos parisienses e ao mundo nos Jogos Olímpicos Paris 2024

De solene a jubilosa, a Cerimônia de Abertura na sequência mudou o foco para um desfile de moda ousado, onde a mesa de um banquete à fantasia serviu como passarela. A festa ainda acontecia, com mais atletas vindo em barcos e torcedores mais empolgados do que nunca, apesar da chuva que caía.

Os espectadores exultantes ao longo do Sena causavam um contraste enorme com os Jogos Olímpicos Tóquio 2020, nos quais as restrições por causa da Covid preveniram as pessoas de participarem da Cerimônia de Abertura. Mas, se Tóquio 2020 foi um testemunho da resiliência do espírito humano, Paris 2024 mostrou a festa que aguarda como recompensa ao final da estrada.

Cerca de 320 mil espectadores puderam aproveitar o show ao vivo nas margens do Sena -- sem contar aqueles que viam das janelas de suas casas que davam para o rio -- além das centenas de milhões de pessoas assistindo ao redor do mundo.

A maior vibração, é claro, estava reservada ao barco da França.

"Espero que esse momento dê um grande impulso à seleção francesa desde o começo, que conquistemos muitas medalhas e, acima de tudo, que a maioria dos atletas fique marcada com memórias para o resto da vida," disse a porta-bandeira francesa, Melina Robert-Michon, presente em sete edições dos Jogos Olímpicos. "Além disso, que todas as pessoas que estiveram aqui -- os voluntários, os torcedores, as crianças que assistirão a isso, o país inteiro -- fique com os olhos brilhando e diga: 'Sim, eu fui sortudo de fazer parte disso'."

Uma amazona, levando a bandeira do Comitê Olímpico Internacional (COI), navega em um cavalo de metal sobre as águas do Sena

Foto por 2024 Getty Images

O significado histórico do momento foi ainda mais amplificado quando imagens históricas que recontavam os últimos 100 anos do esporte foram exibidas nos telões, apresentando o progresso que a humanidade fez no século desde a última vez que Paris recebeu os Jogos Olímpicos, em 1924.

Enquanto as imagens eram exibidas nos telões ao redor da cidade, uma amazona em vestes prateadas carregava a bandeira do Comitê Olímpico Internacional, como se flutuasse ao longo do rio Sena montada em um cavalo de metal.

A jornada dela acabou em Trocadero, onde, agora montando um cavalo vivo, a suboficial da National Gendarmerie Floriane Issert apresentou a Bandeira Olímpica para começar a seção protocolar da Cerimônia de Abertura. Um grupo de voluntários carregou as bandeiras nacionais atrás dela.

Floriane Issert, uma suboficial da National Gendarmerie, carrega a bandeira Olímpica em Trocadero durante a Cerimônia de Abertura

Foto por Stephanie Lecocq - Pool/Getty Images

A pira Olímpica é acesa

Enquanto os atletas seguiam para Trocadero, a chama Olímpica também seguia seu caminho até seu destino final: o Jardin des Tuileries.

A jornada começou com uma viagem pelo metrô francês pelas mãos da lenda do futebol Zinédine Zidane. Entregue a um portador mascarado, a tocha voou pelos telhados parisienses e passeou pelos corredores vazios do Museu do Louvre, até retornar às mãos de Zidane, que carregou a chama para Trocadero.

Depois de cumprimentar alguns torcedores sortudos nas arquibancadas, Zidane passou a chama ao espanhol Rafael Nadal, bicampeão Olímpico, que marcou seu lugar na história da França também, com o recorde de 14 títulos em Roland Garros.

Um barco repleto de superestrelas internacionais do esporte -- Rafael Nadal, Serena Williams, Carl Lewis e Nadia Comaneci -- que juntos somavam 20 medalhas de ouro entre eles, então carregou a tocha até o Louvre, onde a chama continuou sua viagem ao Jardin des Tuileries na companhia de 18 lendas Olímpicas e Paralímpicas da França.

Os heróis esportivos franceses Teddy Riner e Marie-José Pérec pegaram a chama Olímpica para a caminhda até a pira -- um anel de chamas preso a um balão de ar quente, em homenagem ao primeiro voo com um balão movido a hidrogênio ocorrido no mesmo local, em 1783.

Aceso, o balão subiu aos céus quando as primeiras notas da canção "L'hymne à l'amour", de Edith Piaf, soaram e a estrela global da música Celine Dion emergiu na Torre Eiffel para saudar Paris e os Jogos Olímpicos em sua primeira apresentação ao vivo desde que anunciou seu diagnóstico de "síndrome da pessoa rígida".

Um rugido de aplausos veio das arquibancadas ao longo do Sena, em Trocadero e ao redor da capital francesa, enquanto Dion, éterea em um vestido branco cintilante, estendeu os braços no marco mais famoso da cidade à chama Olímpica subindo cada vez mais alto no céu noturno de Paris.