Muito competitivo, Rayan Castro quebra barreiras na ginástica de trampolim e fora do esporte

Por Mateus Nagime
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Foto por Miriam Jeske/COB

Rayan Castro segue quebrando barreiras para a ginástica de trampolim do Brasil. Medalhista em Jogos Pan-Americanos e presença constante em etapas da Copa do Mundo, ele obteve, através de seu ranking, uma vaga aos Jogos Olímpicos para o país, feito inédito para a ginástica de trampolim masculina. Além disso, hoje Rayan também trabalha nas redes sociais e fala abertamente sobre sua sexualidade, tendo consciência de sua influência para a próxima geração, tanto no trampolim quanto fora dele. E tudo isso, com apenas 22 anos. “Me tratam como se fosse old school”, brincou ele durante uma entrevista ao Olympics.com.

“Eu acho que eu devo ser a pessoa mais competitiva que eu conheço”, comentou, deixando claro que ele vai atrás de uma grande apresentação na disputa masculina da ginástica de trampolim durante os Jogos Olímpicos Paris 2024. Ele comentou com muita empolgação o fato de ter virado uma figurinha no álbum realizado com os atletas brasileiros. "É em ordem alfabética, então estou na mesma página de Rafaela Silva, Rayssa Leal, Rebeca Andrade", comemorou Rayan, que compartilhou um vídeo de reação em sua página no Instagram. Muito presente nas redes sociais, hoje o atleta chega a mesmo encarar elas como um trabalho paralelo. "Igual ao início na ginástica. Tudo começou com uma gracinha, mas agora é o minha profissão", disse Rayan que está compartilhando muitas fotos e vídeos dos bastidores na França nestes últimos dias.

Ele é um dos dezesseis atletas que vai competir a prova na Arena Bercy. Rayan, acostumado a disputar com centenas de outros atletas em etapas da Copa do Mundo ou no Campeonato Mundial, sabe o quão difícil foi se classificar. “São só 16 pessoas. Tudo pode acontecer no trampolim. Se um atleta cair, acabou. Na preliminar, você só tem duas chances, mas na final só tem uma chance. Só de ter dezesseis atletas que durante o ciclo inteiro foram consistentes o bastante para estar lá, eu acho que é muito maior do que qualquer resultado que eu tenha em Paris. Óbvio, uma final vai ser um resultado muito bom. Pegar medalha, melhor ainda. Mas o esforço que eu tive para me classificar já conta muito mais do que qualquer resultado que eu vou ter lá, com certeza”, avalia Rayan.

Ele falou pela primeira vez de sua bissexualidade para o portal norte-americano OutSports. Isso nunca foi uma questão levantada em nenhuma entrevista que eu dei e por isso que nunca foi um tópico. Depois daquela entrevista eu pensei ‘nossa, eu realmente nunca tinha falado disso em lugar nenhum”, refletiu Rayan. “Quanto mais a gente falar sobre isso, mais normaliza, mais fácil fica de conversar sobre. E eu fico muito feliz de estar dando esse exemplo tanto no esporte, quanto na vida pessoal para vários atletas.

Rayan Castro queria fazer ginástica artística após ver ídolos pela televisão

Rayan Victor de Castro Dutra nasceu em 29 de março de 2002, em Belo Horizonte. Ele começou na ginástica, por acaso, aos 10 anos. Ele já conhecia a ginástica através de Daiane dos Santos, Daniele Hypolito e Diego Hypolito, mas não sabia como poderia começar a praticar. Até que dois técnicos de ginástica do Minas Tênis Clube foram na escola dele fazer uma peneira e mudaram o destino de Rayan. Na escola, ele já pulava e fazia muita estrela, mas não sabia que essas brincadeiras poderiam ajudá-lo a desenvolver manobras. Rayan espera que o esporte se popularize cada vez mais. “Se a gente conseguir conectar o ‘pula-pula da festa de criança’ com a ginástica de trampolim”, acredita que pode ser um caminho, Rayan acha que pode ser um bom caminho.

Único aluno a passar no teste, ele não conhecia a ginástica de trampolim, mas os treinadores viram o potencial para o trampolim e o levaram para o esporte. Em menos de um ano, Rayan desenvolveu muito rápido sua ginástica e começou a participar das primeiras competições. No final de 2013, ele já participou de sua primeira competição, sul-americano de ginástica de trampolim para crianças de 11 e 12 anos. Com espírito competitivo forte, ele nunca ficava nervoso. Gostava de viajar para os torneios, mas também sempre foi muito competitivo. “Eu até hoje bato nessa tecla que, se eu tivesse escolhido qualquer outro esporte, eu seria muito bom no outro esporte Eu não vou parar até ser o melhor”, revelou ele.

Entre o 'sonho' de Lima 2019 e a medalha de Santiago 2023, uma cirurgia delicada

Rayan participou dos Jogos Pan-Americanos Lima 2019, quando ainda tinha 17 anos, quando ficou em quinto lugar. Foi sua primeira competição internacional como adulto. “Eu adorei competir, é uma pressão diferente. Ficar na Vila, receber uniforme…. Terminei em quinto, mas estava nas nuvens”, contou ao Olympics.com

Dois anos depois, ele foi para os Jogos Pan-Americanos Júnior Cali 2021. A sensação foi um pouco agridoce, pois ele já participava das disputas adultas. Porém, como o torneio dava uma vaga nominal aos Jogos Pan-Americanos Santiago 2023, a decisão foi de ir e já garantir a vaga. “Eu tinha séries muito mais difíceis do que eu fazia no Júnior. A estratégia era facilitar um pouco, para garantir uma nota melhor. E deu tudo certo. Deu uma tranquilidade estar classificado com dois anos de antecedência”.

Em 2022, ele sofreu uma lesão e precisou passar por uma cirurgia delicada na coluna. Mas não deixou isso o abater. Voltou, e voltou mais forte ainda. Em Santiago 2023, ele foi medalhista de prata no individual e bronze no sincronizado com Lucas Tobias. Mais maduro, o Rayan de Santiago, não era o Rayan de Lima, “feliz por competir”, revelou. O foco já era na medalha. A prata no individual encerrou um jejum de 12 anos, desde a prata de Rafael Andrade em Guadalajara 2011.

Muitas contas para a vaga Olímpica, mas a regularidade foi o principal fator para Rayan Castro

A vaga não veio, e Rayan começou a se preparar para a Copa do Mundo. “Nesse ciclo todo eu usei a estratégia de fazer uma série mais simples para conseguir vagas nas semifinais e finais das Copas do Mundo, que era onde valia vaga. Deu tudo muito certo. Só que ali no canto, eu sempre treinava uma outra série mais difícil. Eu tentei fazer em Santiago e não consegui. Consegui fazer pela primeira vez na preliminar do Brasileiro em junho. A gente ainda está decidindo como vai ser a estratégia dependendo dos atletas que vão. Eu venho treinando há um bom tempo essa série, provavelmente a mais difícil que um brasileiro já tentou”.

Prova de que Rayan Castro é mesmo competitivo, ele revelou que ao final da quarta etapa da Copa do Mundo, em Baku, fez uma lista com todos os concorrentes que poderiam ultrapassá-lo no ranking classificatório. Participando do grupo ele foi acompanhando um a um os rivais e ia verificando se eles ganhariam pontos suficientes para passar na frente. “Eu e meu técnico checando um a um. Eu estava no último grupo e competi já sabendo que estava classificado, foi um dos momentos mais legais”, lembra ele.

Nos Jogos Olímpicos Paris 2024, a meta é sempre melhorar a nota. “A nota de Santiago 2023 (58.720) já é uma das maiores da minha vida”, comentou.”Eu gosto de pensar que eu tenho os meus objetivos para uma final olímpica. Tenho certeza que eu tenho qualidade técnica e vontade para isso. Mas é bom entender que são só 16 atletas e já foi muito difícil a gente ter classificado. É a primeira vez que estamos participando tanto no masculino quanto no feminino, por meio de mérito”, comentou o atleta.

Rafael Andrade e Carlos Ramirez Pala foram inspirações para Rayan Castro

Quando Rayan Castro era criança algumas das referências na ginástica de trampolim masculina eram Rafael Andrade, representante brasileiro no esporte nos Jogos Olímpicos Rio 2016 e Carlos Ramirez Pala, que participou dos Jogos Pan-Americanos Toronto 2015. Além deles, Rayan revela que já admirava Camilla Lopes, que hoje é sua colega de seleção brasileira e é oito anos mais velha que ele.

“É muito bizarro, porque quando eu era criança, eu queria ser o próximo Rafael, o próximo Ramires. E no Troféu Brasil, o Ramires anunciou o nome de quem iria para os Jogos Olímpicos Paris 2024 e o Rafael também estava lá competindo. Eu lembro que, quando eu era criança, a Camilla já estava num nível muito grande. E tem muita gente da ginástica de trampolim que treinou comigo,continua a fazer parte do esporte, como técnico, ou na arbitragem”, diz Rayan.

É um sentimento de que não sou mais aquela criança de 13 anos, que deu tudo certo, eu estou indo para os Jogos Olímpicos. E o que vocês fizeram lá atrás abriu portas para o que eu estou fazendo hoje”, complementa o mais novo atleta Olímpico da ginástica de trampolim.

E claro que ele continua a abrir mais portas para a nova geração, como Gabriel Sousa, quarto colocado no Mundial por Idades em 2023, e Arthur Antunes, vencedor da categoria juvenil do Troféu Brasil, com uma nota que lhe daria o título adulto este ano. Os três treinam juntos no Minas Tênis Clube (MTC).

“Eu e o Biel temos dois anos de diferença, então é uma coisa meio assim ‘eu sou o experiente, mas sou só dois anos mais velho’. Acho essa troca muito legal. Tem essas briguinhas internas… o Arthur esses dias me disse que eu vou ser o reserva dele (nos Jogos Olímpicos JO28). Ele vai se classificar pelo Campeonato Mundial e eu vou ter que me classificar pelas Copas”, revelou Rayan, aos risos, na conversa com o Olympics.com.

“Tem graça, mas ao mesmo tempo tem aquele fator do ‘a galera tá vindo’. Eu gosto muito dessa competitividade saudável, de um puxar o outro, querer que o outro melhore. Eu quero muito que eles melhorem, o máximo possível, muito mais do que um dia vou fazer, porque o esporte só ganha notoriedade e cresce assim. Então é mais feliz ainda de estar vendo todo dia eles treinando, se esforçando pensando em ser o próximo Rayan’, re