Começou atribulada a participação de Portugal nos Jogos Olímpicos. Uma greve no aeroporto de Lisboa provocou que a viagem rumo a Tóquio 2020 fosse cancelada, o que levou a seleção portuguesa de handebol masculino, juntamente com o estreante skatista Gustavo Ribeiro e os tenistas Pedro Sousa e João Sousa, a procurar alternativas para chegar no Japão.
Graças à intervenção do Comitê Olímpico de Portugal foi possível fretar um charter para Paris e apanhar um voo de ligação para Tóquio, após algumas peripécias de última hora. O time foi obrigado a viajar 300km em ônibus entre Lisboa e Faro, fazer uma escala inesperada e gastar milhares de euros, mas tudo isso valeu a pena já que a história teve final feliz com todos os atletas a chegarem a Tóquio na manhã de domingo, dia 18.
Logo na partida para Tóquio 2020 foi colocada à prova uma das artes do português, a do improviso. Algo que não podia ser mais diferente da maneira organizada e metódica como trabalha a seleção de handebol liderada pelo técnico Paulo Jorge Pereira.
O homem que revolucionou Portugal é formado pela Faculdade de Desporto da Universidade do Porto e um dos temas investigados em sua etapa acadêmica foi “A organização do ataque da Suécia”, após a vitória sueca no Europeu de 1994, jogado em Portugal. Estudioso do jogo, líder com capacidades inatas, Paulo Jorge Pereira melhorou as classificações históricas no Campeonato da Europa 2020 (6º), Campeonato do Mundo 2021 (10º) e pela primeira vez classificou Portugal para os Jogos Olímpicos.
Curiosamente, parte dessa formação enquanto estudante passou pelo Brasil, onde o técnico esteve nos jogos universitários de handebol. Mas como se chegou até aqui? Não é fácil resumir a trajetória do handebol português, mas podemos destacar duas componentes: a estratégica e a emocional.
"Know how" e união do grupo fizeram crescer o jogo de Portugal
Estrategicamente, a internacionalização do técnico [Paulo Jorge Pereira foi campeão de África com as seleções femininas de Angola e Tunísia] e dos jogadores foi um passo chave.
Atualmente, Portugal tem ativos como o pivô Luís Frade, primeiro português na história a vencer a Champions League, prova que ganhou com o FC Barcelona [onde é companheiro dos brasileiros Thiago Petrus e Haniel Langaro]. Frade é apenas um de vários portugueses que atuam nas competitivas Ligas de Espanha, Alemanha, França ou Hungria.
Esse "know how" e união de grupo fizeram crescer o jogo de Portugal enquanto seleção, uma atitude que em campo se destaca pela fisicalidade na defesa e rápidas transições defesa-ataque. É também normal ver Portugal atacar em superioridade numérica, uma nuance tática de riscos controlados que tem dado bons resultados.
A chegada de treinadores estrangeiros provenientes de grandes escolas do handebol europeu ao campeonato português elevou a maneira de pensar o esporte, o nível geral de jogo melhorou e com isso vieram melhores performances dos times portugueses nas provas europeias. Na época 2020/2021, o FC Porto jogou as oitavas de final da Champions League, enquanto o Sporting CP chegou nas oitavas da Liga Europeia.
Por Portugal e por Alfredo Quintana
Outro dos aspetos chave para o crescimento do nível de jogo é a política de recrutamento da Federação Portuguesa de Andebol, que tem beneficiado do trabalho feito pelos times. Os luso-cubanos Alexis Borges, Daymaro Salina, Victor Itturiza e Alfredo Quintana entraram no grupo para adicionar qualidade.
Aqui entra o aspecto emocional. Quando Portugal surfava a onda mais perfeita de sua história, uma tempestade surgida do nada fez tremer as fundações do projeto. O goleiro Alfredo Quintana, um dos melhores do mundo no seu posto específico, líder carismático da seleção e do FC Porto, chegou a Portugal em 2011 e passou a representar a seleção em 2016. Com imponentes 2,01m de altura e defesas do outro mundo, o primeiro cubano a jogar em Portugal ganhou o coração dos fãs de handebol. Coração que foi partido a 22 de fevereiro de 2021, quando Quintana sofreu uma paragem cardiorrespiratória durante um treino, falecendo cinco dias mais tarde.
Vivíamos a ressaca de um grande Mundial e o país se preparava para jogar um Pré-Olímpico decisivo valendo um lugar em Tóquio 2020. Vitória frente a Tunísia, derrota contra a Croácia. Tudo para decidir em França, contra a França. A resposta dos jogadores foi perfeita: vitória por 29-28 graças a intervenções decisivas do terceiro goleiro, Gustavo Capdeville, seis gols do ponta António Areia... e a jogada mais épica da história do handebol português: intercepção do capitão Rui Silva na defesa, roubo de bola, contra-ataque perfeito e gol a cinco segundos do final!
A presença inédita de Portugal nos Jogos Olímpicos foi conquistada no mais doloroso dos contextos. A história de superação deste grupo de homens recebeu até a felicitação do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que definiu o momento como "a vitória póstuma de Quintana".
Por que parar por aqui? Os “Heróis do Mar” estão no grupo B dos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020 e os encontros já têm data e hora. Por Portugal e por Alfredo Quintana é preciso continuar.
- Portugal vs Egito dia 24 de julho | 19:30 locais (dia 23 | 11:30 horário de Lisboa)
- Portugal vs Bahrain dia 26 de julho | 19:30 locais (dia 25 | 11:30 horário de Lisboa)
- Portugal vs Suécia dia 28 de julho | 11:00 locais (dia 28 | 3:00 horário de Lisboa)
- Portugal vs Dinamarca dia 30 de julho | 19:30 locais (dia 29 | 11:30 horário de Lisboa)
- Portugal vs Japão dia 1 de agosto | 9:00 locais (dia 1 | 1:00 horário de Lisboa)