Fernando Rufino, o 'Caubói de Aço', quer laçar outro ouro na canoagem paralímpica

Por Daniel Perissé
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Fernando Rufino de Paulo of Team Brazil celebrates his Gold medal win after he competes in the Canoe Sprint Men's Va'a Single 200m - VL2 Final A on day 11 of the Tokyo 2020 Paralympic Games at Sea Forest Waterway on September 04, 2021 in Tokyo, Japan
Foto por Dean Mouhtaropoulos / Getty Images

Natural da pequena Itaquiraí, no Mato Grosso do Sul, Fernando Rufino sempre morou na fazenda, mas tinha o desejo de conhecer o mundo. Seu plano inicial era fazer isso sendo peão de rodeio, porém foi a canoagem paralímpica que o projetou, principalmente depois de se tornar o primeiro brasileiro a conseguir um ouro na modalidade, em Tóquio 2020.

Em 2005, quando já tinha decidido investir na montaria de bois, Fernando acabou atropelado por um ônibus e perdeu parcialmente o movimento das pernas. Depois de 15 dias internado e mais cinco meses de recuperação, ele foi apresentado ao esporte paralímpico, e optou pela canoagem.

Tendo começado em agosto de 2012, dois anos depois ele viria a ser campeão brasileiro, e em 2015 foi bronze no caiaque no Mundial de Milão. Antes disso, ainda teve que tomar uma decisão: escolher entre a canoagem e o fisiculturismo, que também ainda praticava.

“Foi tudo muito rápido, eu já era uma pessoa que tinha um perfil de atleta. Deus me deu um talento, que foi ter força. Por dois anos eu fui atleta de fisiculturismo, só que eu estava me tornando muito grande. Aí já estava bem na canoagem e fiquei,” comentou o "Caubói de Aço", atualmente com 39 anos, ao Olympics.com.

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Treinamento foca na força e na potência

Em um esporte no qual ter potência é fundamental, Rufino conseguiu unir o melhor dos dois mundos: manteve os exercícios de musculação, que faz três vezes por semana, e complementa com os treinos na água, de segunda a sábado, na preparação para os Jogos Paralímpicos Paris 2024.

“Depende da fase do treinamento, mas a programação da água tem que combinar com a da musculação. Agora estou em uma etapa de monitoramento de resultado, e daqui a pouco começo a encurtar as sessões para ir colocando força e explosão,” explicou o atleta, de imponente porte físico.

Rufino divide seu ano entre os treinamentos para competições – como agora, em Curitiba – e períodos em que fica na fazenda no Mato Grosso do Sul, onde cumpre toda a rotina do campo. Acorda cedo, tira leite, anda de cavalo, toca uma boiada e faz quaisquer reparos que forem necessários:

“Lá eu tiro da minha cabeça o que é ser atleta, costumo dizer que é minha academia rural. Faço um buraco na terra, quebro madeira com a marreta, mantenho minha musculação ativada. Ao mesmo tempo em que estou descansando, também alimento o meu ego por estar fazendo o que eu gosto. Então o serviço faz parte do meu investimento, do que eu ganho também na canoagem.”

Vitória em Tóquio 2020 elevou o nível da competição

Em Tóquio 2020, Fernando Rufino conquistou o título mais importante da sua carreira: o ouro na classe VL2 da Va’a (canoa havaiana) individual. O brasileiro ganhou a prova com um tempo de 53s077, bem à frente do americano Blake Haxton (55s093) e do português Norberto Mourão (55s093).

“Fiquei feliz demais por escrever meu nome na história. Quando eu cruzei a linha de chegada, eu vi que valeu a pena todo o trabalho que foi, nove anos de preparação para aquela medalha. A gente remou pela vida, pelo coração mesmo. Então foi um momento que a gente deu o grito final ali, soltou o leão da jaula. Não tem conquista mais valiosa do que essa,” destacou.

Sobre a possibilidade de obter o bicampeonato Paralímpico, o atleta prevê uma briga boa:

“Não vai ser fácil, pois o nível subiu muito. Fui campeão com 53 segundos. Se eu fizer esse tempo em Paris, agora vou ficar em sexto ou sétimo mais ou menos. É aí que você vê a evolução do esporte,” destacou o brasileiro, apontando como seus principais rivais os EUA e Portugal novamente.

Na capital francesa, Fernando Rufino será o único a correr duas provas – além da va’a, vai também no caiaque (KL2), mas nessa disputa ele espera pelo menos chegar no pódio, já que a concorrência é muito grande (“pelo menos dez países”, segundo o brasileiro).

Igor Tofalini, companheiro de treino e rival na raia de competição

Outro "concorrente" a ser batido na classe VL2 é o também brasileiro Igor Tofalini, companheiro de treinos de Rufino e com quem divide apartamento desde 2018 quando não está na fazenda, em meio aos períodos pré-competição.

Hoje com 41 anos, o chamado "Peão das Águas" é natural de Londrina e também foi profissional dos rodeios até 2011, quando fraturou a coluna ao cair de cima de um boi e levar um pisão dele. Assim como Rufino, foi no mesmo hospital em Brasília que ele foi apresentado do esporte adaptado.

Hoje o atleta chega para sua segunda edição dos Jogos Paralímpicos - competiu na Rio 2016 - como bicampeão mundial da mesma prova que Fernando, obtendo o título em 2018 e 2022, e faz toda a preparação junto com o medalhista paralímpico, em um clima de muito respeito e amizade fora das raias.

"Hoje treino junto com o Igor, que é bicampeão mundial e rival meu também. Ele é um cara que me ajuda muito no meu treinamento e vamos estar nos Jogos, dois caubóis de rodeio disputando medalha. Vamos remar juntos lá, um ajuda o outro. Nós somos muito parceiros, então é um cara que eu admiro muito, tenho muito respeito por ele como pessoa e como profissional também," comentou Rufino, que é padrinho de casamento dele.

E o que a torcida do Brasil pode esperar do chamado “Caubói de Aço” nas raias dos Jogos Paralímpicos?

“Um brasileiro de verdade, que vai representar do cara que come marmita ao do mais alto escalão, que vai assistir na televisão de 75 polegadas. Vai esperar um cara que conhece o calor do brasileiro mesmo, que vai estar lá de corpo e alma,” respondeu.