Não restam dúvidas de que a B-girl Vanessa coloca Portugal no mapa do mundo do breaking, uma das novidades no programa de Paris 2024. E faz muito bem, inclusive, e se prepara para disputar a Série de Classificação Olímpica (OQS, sigla em inglês para Olympic Qualifier Series), de 16 a 19 de maio em Xangai (República Popular da China), e de 20 a 23 de junho em Budapeste (Hungria).
Novidades de Paris 2024 | Descubra o que é o breaking
A dança e o esporte sempre estiveram presentes na vida de Vanessa Marina Cartaxo Farinha, leiriense de 32 anos de idade, expoente da modalidade em seu país. Durante a infância e adolescência, praticou ballet clássico e contemporâneo, além de ter contato com o hip hop e começar pelo street dance (dança de rua).
Mudou-se para Lisboa para estudar na Escola Superior de Dança e, em meio à efervescência cultural e artística da cena urbana lisboeta, começou a frequentar pequeno grupo que praticava o breaking na Gare do Oriente (Parque das Nações). Ali formavam uma família e um aprendia com o outro.
Sua curiosidade e criatividade fizeram com que desenvolvesse um estilo próprio. Vanessa esteve na então novidade que era a "Eurobattle", organizada no Porto, em 2009. Mas ela foi como espectadora. Em um primeiro momento o breaking não lhe despertou interesse, achava as meninas lentas nos movimentos e sem vasto repertório.
Entretanto, enquanto abraçava a modalidade, quis fazer à sua maneira. Pediu para que o amigo B-Boy Jordan, colega do grupo da Gare do Oriente, a orientasse no que estava bem e no que estava mal. Foram as observações, a exigência e a busca pela excelência que fizeram apaixonar-se pelas batalhas e a competitividade que o breaking oferece.
Mudança para Londres a ajudou a crescer no breaking
Anos mais tarde, Vanessa partiu para Londres a fim de se aprimorar no esporte. Na Grã-Bretanha encontrou cenário mais competitivo. Muito diferente do que tinha em Portugal. Desafiada, adaptou seus treinos e incorporou movimentos de outras modalidades, como o basquete e o boxe. Além disso, melhorou suas condições ao se concentrar na respiração e no foco.
“O mental no breaking é mais importante que o físico. Não é só treinar, fazer os movimentos e ir para casa. O psicológico, o ambiente, os fatores externos influenciam nossa dança e como nos sentimos. Temos que prestar atenção e ouvir o nosso corpo”, comentou Vanessa em entrevista para o Olympics.com.
Entrevista | B-girl Vanessa empodera meninas e Portugal pelo breaking
Incansável, ela não tardou em colher os resultados de um trabalho tão intenso. Em 2019, faturou o BC One Cypher britânico. Em 2022, foi bronze no Campeonato Europeu, chegando às quartas de final no ano seguinte.
"Sou muito competitiva e se alguém pensar que não posso fazer algo, isso me motiva. Sou motivada pelo pensamento de ser mediana. Não quero ser apenas boa. Quero ser a melhor possível", acrescentou.
Representatividade e o trabalho para inclusão das mulheres no esporte
Na lista de chamada das grandes batalhas de breaking mundo afora, é bem fácil achar o nome da B-girl Vanessa. É só procurar pela bandeira portuguesa à frente dele, bem distinta das outras. Um detalhe que faz dela não apenas uma "embaixadora" do país, mas representante de todas as mulheres portuguesas.
Ela já pensa nas próximas gerações e no futuro do breaking em Portugal. Quer proporcionar a quem vem pela frente justamente aquilo que ela não teve, sem precisar passar por situações que poderiam ter sido evitadas. Em um contexto cuja presença masculina era maior, conheceu o esporte aos 20 anos sem nunca antes haver praticado. Através dele, tem ganhado o mundo. Arriscou, experimentou, viveu e venceu. Conheceu.
Para que serve o conhecimento se ele ficar confinado? Partilhado, ele estabelece pontes e abre portas para toda a sociedade.
“Adoro conhecer novas garotas que entram na cena, que não sabem com quem falar, porque muitas vezes a pessoa para falar é um homem. Tento entender como é no país delas, o que pode ser feito naquele país. Se cada menina treinar e fazer [o breaking] crescer no seu país, ele vai se espalhar pelo mundo”, explicou Vanessa para o Olympics.com. “Gosto de mostrar o empoderamento feminino na comunidade do breaking, porque já passei por muitas situações, é uma jornada diferente da dos homens. Acho que é muito importante mostrar às garotas o valor delas”, ressaltou.
Este pensamento, somado à adaptação nos treinos e repertório das apresentações que teve que fazer quando chegou em Londres, fizeram a B-girl criar a plataforma Time Your Workouts. Volltada para as mulheres, a iniciativa apresenta uma rotina de exercícios físicos para o breaking.
Sobre o papel deste seu projeto, Vanessa considerou: “Também queremos organizar eventos, painéis, criar um festival para garotas. Tenho muita motivação para fazer a diferença porque odeio injustiças. Odeio que achem que somos menos que outra pessoa. Somos iguais e quero mostrar ao mundo o que mulheres podem fazer.”
Breaking com significado: 'Vim ao mundo para inspirar garotas'
A B-girl irá disputar a Série de Classificação Olímpica (OQS, sigla em inglês para Olympic Qualifier Series), de 16 a 19 de maio em Xangai (República Popular da China), e de 20 a 23 de junho em Budapeste (Hungria). No breaking em Paris 2024 serão 13 participantes em cada gênero, sendo que sete deles vão sair da média de pontos obtidas nas duas etapas.
Mais | Breaking em Paris 2024: sistema de classificação
Para poder competir na OQS, Vanessa terminou a fase de classficação em 11º lugar entre as 40 competidora que estarão na OQS, em busca de uma vaga no breaking em Paris 2024. Na capital francesa, a modalidade fará a estreia no programa Olímpico.
“É muito importante para o breaking estar nos Jogos Olímpicos. É um esporte de jovens, de união, em que todos são bem-vindos. É uma cultura, um estilo de vida. Não para na dança, mas também é como você age, como come, como se veste e se movimenta. Isso é maior até que o hip hop. É o que vamos mostrar”, refletiu a atleta para o Olympics.com.
Pioneira do breaking em seu país, seus passos criativos, sólidos e inovadores têm derrubado barreiras e a levado para lugares onde sequer pensava quando começou.
Se através das batalhas ela vai atrás de realizar o sonho Olímpico, são também as diárias batalhas fora das pistas que a fazem levar consigo na bagagem, um legado de representatividade da mulher portuguesa e empoderamento feminino.
"Vim para o mundo para inspirar garotas para terem suas jornadas. É mais que breaking”, concluiu.